HISTÓRIA E CULTURA

As Pistoleiras do Velho Oeste

0117 01aa45Na segunda temporada da série da HBO “Westworld”, a personagem Dolores (foto ao lado, interpretada por Evan Rachel Wood) lidera uma revolta de androides, agindo como uma pistoleira ...

sanguinária do Velho Oeste. O interessante é que, embora não fosse muito comum, existiram de fato ferozes pistoleiras naquele tempo. O mito do cowboy, perpetuado pelo cinema e pela literatura, promove a ideia de um homem durão, estoico e calejado, enfrentando sozinho as intempéries e a selvageria de terras recém-colonizadas.

Mas a fronteira não atraía apenas figuras como Butch Cassidy e Sundance Kid, que conhecemos no cinema numa versão romantizada. Havia também mulheres que fugiam aos padrões esperados. Moças de casca grossa, seja por desejo ou necessidade, elas também pegaram em armas para se virar naquela terra de ninguém. Algumas dessas histórias entraram para o folclore – Calamity Jane e Annie Oakley, por exemplo –, mas havia muitas outras.

“Não foram só meia dúzia. As mulheres sempre lutaram”, afirma Carla Cristina Garcia, cientista social da PUC-SP. “No Velho Oeste, os homens eram vaqueiros ou iam para o garimpo; muitas mulheres ficaram sozinhas e cabia a elas defenderem a si próprias.” Além disso, muitas mulheres que iam para o Oeste queriam escapar de seu passado, outras fugiam das restrições da sociedade do Leste.

A CORRIDA DO OURO

Até meados do século 19, apenas um quarto do atual território dos Estados Unidos, na Costa Leste, havia sido ocupado. Em 1840, a teoria de que os norte-americanos tinham o direito divino de colonizar novas terras tornou-se um mote expansionista. A descoberta de ouro em Sutter’s Mill, no território de Serra Nevada, na Califórnia, deu um novo impulso ao avanço para o Oeste. Em três anos, mais de 200 mil pessoas migraram para lá, buscando riquezas.

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O Velho Oeste não era tão violento quanto se imagina. Os cowboys eram mais peões do que pistoleiros e passavam longas semanas longe de casa. Os rebanhos eram enormes e a terra árida tornava necessário percorrer grandes distâncias em busca de pasto e água. De dia na sela, à noite dormindo sob as estrelas. Se a vida no Oeste não tinha tanto glamour, para Martha “Calamity Jane” (Jane Calamidade) Cannary a dureza era um preço pequeno a se pagar pela liberdade.

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Calamity Jane 

Martha viajou para o Oeste com 13 anos, acompanhada dos pais. Gostava da companhia de cowboys e caçadores. Perambulou pelo país e imortalizou suas aventuras em uma autobiografia, A Vida e Aventuras de Calamity Jane. Sua história foi narrada, já que nunca aprendeu a ler e escrever. Falava de aventuras, emboscadas, tiros, lutas contra os índios. Sua lista de ocupações menos emocionantes incluía os ofícios de cozinheira e lavadeira. Conta-se que foi esposa do famoso Wild Bill Hickok, e trabalhou como batedora.

E foi como batedora que ela serviu na campanha do General Custer em 1872. Nessa época é que ela passou a se autodenominar Calamity Jane. Depois, trabalhou um tempo como prostituta e assim conheceu Wild Bill Hickok, com quem teria se casado e, segundo ela, era o pai de sua filha Jane, que teria nascido em 1873. A criança depois foi adotada. Em 1941 foi encontrado um registro do casamento de 25 de setembro de 1873, em Benson’s Landing, Montana, que aparentemente confirma a história.

O SHOW DE BUFFALO BILL


Calamity Jane se mudou para El Paso, Texas, em 1884, onde se casou com Clinton Burke em 1885. Se separaram em 1895. Em 1896 ela começou a viajar com o show de Buffalo Bill (Buffalo Bill’s Wild West show), onde continuou até o fim da sua vida. Sua reputação era a de uma bêbada arruaceira que entrava e saía da cadeia com frequência. Ela morreu de complicações de uma pneumonia em 1903.

Com a fama, merecida ou não, de Calamity Jane se espalhando, outra atividade se tornou popular: os shows do Velho Oeste. Eram espetáculos itinerantes com demonstrações de proeza no tiro, cavalgadas e laço. Faziam também propaganda pelo extermínio dos nativos e do expansionismo. Foi William Frederick Cody, conhecido como Buffalo Bill, que se tornou dono do show mais conhecido do país.

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Ele e seus concorrentes valorizavam os talentos femininos. O espetáculo dos irmãos Miller, por exemplo, empregava 50 mulheres. Ases da sela, May Lillie e Lucille Mulhall se tornaram cowgirls famosas. Mulhall, que se uniu ao show de Bill em 1909, laçava oito cavalos a galope com uma mesma volta de corda.

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Lucille Mulhall

Foi em 1885, três anos após dar início ao seu show, que Bill conheceu sua maior estrela: uma jovem atiradora chamada Annie Oakley.

ANNIE OAKLEY, A MAIOR ATIRADORA DO OESTE

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Phoebe Ann Oakley Moses nasceu em Ohio em 1860. Atirava desde os 12 anos. Fez tanto sucesso que, quando a trupe esteve em turnê pela Europa, a rainha Vitória, da Grã-Bretanha, assistiu três vezes ao show. Outro membro da realeza, o kaiser Wilhelm II, da Alemanha, confiou tanto em sua perícia com a arma que deixou que ela a demonstrasse atirando nas cinzas de seu cigarro – enquanto fumava…

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Annie Oakley

Conhecida como Little Miss Sure Shot, ou “Senhorita Tiro Certeiro”, Ann levava uma vida pacata fora da arena. Casada, era religiosa e considerava mandar bala uma maneira de mulheres aprenderem a se proteger. Estima-se que tenha ensinado 15 mil mulheres a atirar. Quando morreu, em 1926, deixou muito de seu dinheiro para a caridade, incluindo instituições pelos direitos da mulheres. Annie Oakley nunca usou as armas como ameaça, diferentemente de foras da lei como Belle Starr.

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Belle Starr, a Rainha dos Bandidos, no Arkansas em 1886.

BELLE STARR, A RAINHA DOS BANDIDOS

“Entre os notórios bandidos que roubaram, enganaram e assassinaram moradores do centro-oeste entre 1864 e 1886, havia várias bandidas que eram tão desonestas e violentas quanto eles”, afirma Chris Enss no livro Bad Girls: Outlaw Women of the Midwest. Famosa fora da lei, a “Rainha dos Bandidos” Belle Starr era conhecida pela associação com Jesse James e protagonista de uma extensa lista de atividades ilegais. Belle combinava os vestidos vitorianos com um enorme coldre e um chapéu Stetson masculino, adornado com plumas. Quando seu marido foi preso por roubo, Belle deixou os filhos com parentes e passou a assaltar por conta própria. Era procurada por roubar cavalos e gado – crime sério no Velho Oeste. Belle foi julgada e passou nove meses presa. Logo retomaria as atividades criminosas. Aos 40 anos sofreu uma emboscada. Tentou fugir a cavalo, mas um tiro nas costas a derrubou.

O WILD BUNCH

Houve outra bandidona quase tão famosa quanto Belle Starr: a “Rosa do Bando Selvagem”, Laura Bullion, que cresceu no Texas e aprendeu o ofício da bandidagem com o pai, ladrão de bancos. Tornou-se prostituta na adolescência, conheceu a gangue dos foras da lei Butch Cassidy e Sundance Kid e se juntou ao grupo. Foi nesse bando que ela conheceu seu grande amor, o também ladrão de bancos Ben Kilpatrick.

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O “Bando Selvagem”, ou “Wild Bunch”, que era o bando de Butch Cassidy e Sundance Kid. Na primeira fileira, da esquerda para a direita: Sundance Kid, Ben Kilpatrick e Butch Cassidy. De pé vemos Will Carver e Harvey Logan,. A foto foi tirada em 1900 em Fort Worth, Texas. Cassidy se gabava de nunca ter matado um único homem ou mulher em toda a sua carreira. As alegações sobre a gangue eram falsas, no entanto. Will Carver e outros membros da gangue mataram várias pessoas durante o período em que foram perseguidos pelos homens da agência de detetives Pinkerton, contratados para prendê-los depois de vários assaltos bem-sucedidos.

Em 1901, Laura foi presa por assaltar um trem. Após três anos na prisão, abandonou a vida de crimes e morreu muitos anos depois como uma respeitável costureira.

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Foto da prisão de Laura Bullion

Após a Guerra Civil americana, uma nova emenda foi anexada à Constituição, ratificando o direito ao voto dos homens negros. As mulheres, brancas ou negras, foram, no entanto, deixadas de fora. Mas o sufrágio feminino se beneficiaria desses exemplos de mulheres que defenderam sua independência, mesmo à base de tiros, como Pearl Hart.

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PEARL HART, A POLÊMICA FEMINISTA

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Pearl nasceu no Canadá por volta de 1870 e foi para os Estados Unidos em busca de riqueza. Foi presa por um assalto a diligência. Ao ser julgada, criou polêmica. “Não consentirei em ser julgada sob uma lei para cuja criação meu sexo não teve voz”, disse. A declaração não a livrou de três anos na cadeia. A novidade de uma mulher assaltante de diligência rapidamente gerou uma frenesi da mídia e repórteres de grandes jornais logo se juntaram à imprensa local, clamando por uma entrevista e fotografia de Hart. Um artigo na Cosmopolitan afirmava que Hart era “exatamente o oposto do que seria esperado de uma assaltante mulher “, embora, “quando está com raiva ou determinada, linhas duras apareciam sobre seus olhos e boca.”Os moradores também estavam fascinados com ela, tendo ela ganhado diversos presentes de admiradores.

 

Fonte: https://otrecocerto.com