VERDADES INCONVENIENTES

Por que no Brasil tudo custa mais caro - Parte 1

bracaro120/04/2011 - Por Flávia Gianini - Apesar de do crescimento exuberante da economia brasileira, com PIB 36,1% maior nos últimos 10 anos e renda per capita 20% acima da inflação no período, está longe o dia que não será vantagem ir às compras em Miami. Para comprar um iPad no Brasil, é preciso desembolsar em torno de R$ 1,6 mil. Com mais R$ 259, dá para ir para os EUA buscar o aparelho e, de quebra, se bronzear na areias de Long Beach, já que a mesma versão por lá custa apenas R$ 800. Se o brasileiro pudesse trazer dos EUA um Corolla zero na mala, ele desembolsaria R$ 29 mil. Mas se for comprar no País, o veículo sai por mais de R$ 60 mil. E a japonesa Toyota fabrica o veículo nos dois países. E as diferenças absurdas não se ...

restringem somente aos EUA. O valor gasto para se comprar um Fiat Uno no Brasil, mais ou menos R$ 23 mil, é o mesmo preço de um Smart na Europa. Aquele pequeninho que aqui custa quase R$ 60 mil. Ou um Golf, que por lá vale cerca de 12 mil euros, ou até mesmo um Jetta, ou um Honda Civic.

Não é à toa que o brasileiro é o turista que mais compra nos EUA: US$ 4,8 mil por pessoa. A distorção entre os valores dos produtos aqui e lá fora tem os impostos como causa principal.

Confusão tributária

É uma sopa de letrinhas: IPI, ICMS, ISS, Cide, IOF, Cofins. Aqui, quase metade do valor de um carro (40%) vai para o governo na forma de tributos. Nos EUA e na China é 20%, e na vizinha Argentina, 24%. O padrão se repete com os outros produtos. Enquanto no resto do mundo é regra ter um único imposto para o consumo, aqui são pelo menos seis. A confusão gera cobrança de impostos em cascata. O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é um imposto estadual, por exemplo, incide sobre o Cofins, o PIS e o IPI, que é um imposto federal. Ou seja: você paga imposto sobre imposto e tudo fica mais caro. O peso do ISS sobre o preço final dos automóveis chega a 5%. Já o PIS corresponde a quase 2% e o Cofins é de 7,6%. 'Só o IPI pode chegar até 40% do valor de um veículo dependo da potência dele', explicou o analista tributário Marcos Camargo.

Compras online

O último imbróglio na área tributária está relacionado às compras online. Um acordo do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), assinado por 18 Estados, determina que a partir de 1º de maio deste ano, esses estados passem a recolher 10% de ICMS sobre os produtos comprados pela internet, ficando 7% para os Estados de origem onde de se concentram as lojas pontocom. Se o Estado de origem da compra for da região Nordeste, a partilha será 12% para onde a loja está instalada (origem) e outros 5% para o Estado de destino.

Brasil Custoso

Outro fator que afeta o custo dos produtos brasileiros é a ineficiência nacional em diversas áreas, como infraestrutura e administração (a velha e boa burocracia). Esse atraso é chamado de 'Custo Brasil', pelos especialistas e pode sobrecarregar em até 36% o preço do produto brasileiro em relação aos fabricados na Alemanha e nos Estados Unidos. Somado a valorização do real em relação ao dólar, esse custo ajuda a explicar porque o um país que está cada vez mais rico como o Brasil, exporta cada vez mais produtos primários e semimanufaturados e importa mais produtos de maior valor agregado e de tecnologia avançada. 'É literalmente exportar laranja in natura para um cliente e comprar dele suco de laranja em caixinha', explica Camargo.

A diferença de juros cobrada entre um financiamento no Brasil e nos demais países intensifica a disparidade de valores. A média cobrada no Brasil é de 25% ao ano, enquanto nos países ricos ela não passa de 10%. Além do mais, se levarmos em conta que renda mensal média do brasileiro (R$ 1,5 mil) é bem menor que a de regiões mais ricas (R$ 6 mil nos EUA, por exemplo), tudo é mesmo muito mais caro por aqui. Enquanto um brasileiro que ganha o salário médio no país precisa trabalhar um pouco mais de um mês para comprar um iPad, um americano consegue comprar o tablet da Apple em menos de três dias.

Mercado de luxo

Mas impostos e custo Brasil não explicam tudo. Outra razão importante para a disparidade de preços é o crescimento do chamado mercado de luxo. No Brasil, este mercado nem é tão luxuoso assim, entretanto movimentou mais de R$ 11,8 bilhões em 2010, uma alta de 22% em relação ao ano anterior.

Roupas que aqui são consideradas 'de marca', lá fora não passam de produto popular. O irônico é que o preço alto muitas vezes vira uma razão para consumir o produto. A calça da italiana Diesel é um exemplo. Não chega a ser popular lá fora, mas a mesma peça masculina pela qual os brasileiros pagam R$ 750, os americanos desembolsam R$ 260, e os franceses R$ 226.

"O brasileiro tem um viés de consumo americano, mas gosta de achar que é europeu. Ele não admite que o produto que está nas vitrines de Paris não esteja aqui. Os outros países da América Latina trabalham com coleções passadas. O Brasil, esse país megatropical, compra a coleção de inverno em pleno verão porque é a que está sendo vendida lá fora", afirma Carlos Ferreirinha, dono da MCF Consultoria.

A Magia das marcas

2014 - Como era uma época em que a qualidade dos produtos nacionais era duvidosa, criou-se a referência de que tudo do exterior é intrinsecamente melhor do que o produto nacional. Hoje, mais de vinte anos após esse processo, ainda existe a percepção, por exemplo, que a qualidade do vinho chileno e argentino é bem superior à do brasileiro — mesmo a indústria nacional tendo feito investimentos maciços em qualidade, levando o vinho brasileiro a ser reconhecido por críticos nacionais e internacionais, como Jancis Robinson, Steve Spurrier, Adam Strum, Charles Metcalfe, entre outros.

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Marcas que no exterior são conhecidas como medianas — Victoria Secrets, Tommy Hilfiger, Ralph Lauren, Honda etc.— são tratadas como marcas de grife no Brasil.

— Assim, as marcas nacionais se tornaram referência para as marcas estrangeiras entrarem no Brasil. Para exemplificar, o Honda City (LX, motor 1.5, 115 cavalos e pneu aro 15) é vendido no Brasil a R$ 60.500,00 enquanto no México (que importa o carro da fábrica de Sumaré/SP) é vendido a R$ 36.000,007. No Brasil, 36% do produto final de um carro são referentes a impostos, enquanto que no México este percentual é de 18% — explica Coelho. — Ou seja, o preço no Brasil sem impostos é R$ 38.720,00. Para o México, será considerado o valor de R$ 27.220,00, sendo R$ 29.520,00 o valor efetivo sem os impostos (R$ 36.000,00 x 0,82) menos R$ 2.300,00 (valor estimado do custo existente de logística para se levar o carro do Brasil ao México e o lucro da Honda Brasil ao vender para a Honda México).

O especialista observa: “Mas antes que se coloque a culpa nos gestores da Honda — pela percepção que desejam apenas obter maior lucro no Brasil — imaginemos se eles embutissem a mesma margem de lucro do México à taxa de impostos brasileiros. Isso faria com que o preço aqui do Honda City fosse R$ 42.531,00 (R$ 27.220,00 embutindo-se a carga tributária brasileira de 36%)”.

— Acontece que, no Brasil, o carro mil cilindradas cria o preço referência para as outras montadoras. Dos carros mais baratos que o Brasil tem, destacam-se o Ford Ká (motor 1.0, 68 cavalos e pneu aro 13, a partir de R$ 25.000,00), o Fiat Novo Uno (motor 1.0, 73 cavalos e pneu aro 13, a partir de R$ 26.000,00) e o Renault Clio (motor 1.0, 77 cavalos e pneu aro 13, a partir de R$ 24.000,00) — exemplifica. — Se o carro mil cilindradas (sem nenhum opcional, itens de segurança que o Honda City possui, conforto e outros artigos de qualidade) está na faixa de R$ 25.000,00, então cobrar valor R$ 42.531,00 pode parecer insuficiente frente a todos os diferenciais, isso explica porque a Honda acaba cobrando valor bem superior ao praticado em outros países.

Até a vodca...

Coelho explica que, assim, algumas marcas estrangeiras acabam embutindo no preço o chamado Lucro Brasil pela referencia que possuem dos produtos nacionais.

— Outro exemplo típico é da vodca. Duas marcas são tidas como no mesmo nível de qualidade na Europa: Smirnoff e Absolut. Entretanto, a Smirnoff chegou oficialmente no Brasil em 1974. Já a Absolut apenas em 2000. Ao entrar no Brasil, esta se posicionou com preço superior ao da Smirnoff, fazendo com que o brasileiro percebesse este produto como de maior qualidade — relata.

De acordo com Fabiano Coelho, “é importante entender esse fenômeno do Lucro Brasil por conta das decisões governamentais. Muitas vezes, percebe-se tentativas do Governo de conceder isenções fiscais, incentivos à indústria nacional e taxação de produtos estrangeiros de forma a incentivar o consumo de produtos nacionais. Só que o preço referência mostra que isso só fará aumentar o lucro dos empresários e nunca baixará o preço efetivo do produto”.

— Existem duas maneiras básicas de fazer os preços baixarem: aumentar competitividade e concorrência, ou reduzir o preço do produto tido como referência — conclui.


Por que pagamos mais caro no Brasil?

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01/2013 -Por Ricardo Amorim - A diferença de preços do Brasil com o resto do mundo é impressionante. Do restaurante aos eletrônicos, quase tudo é mais caro aqui. Razões não faltam, começando pelos impostos. Uma das cargas tributárias mais elevadas do planeta, particularmente concentrada sobre consumo e produção, encarece tudo que é feito e comprado aqui. Impostos não explicam todas as distorções. Também as margens de lucros são mais elevadas. A esquerda culpa a ganância dos empresários pelas gordas margens. A explicação está equivocada. Sim, empresários querem cobrar mais por seus produtos e serviços. Se você pudesse dobrar seu salário, não dobraria?

A pergunta é: por que conseguem cobrar mais aqui? Por que aceitamos pagar mais? Apesar dos avanços desde 1994, adistribuição de renda no Brasil ainda é das piores. Grande concentração gera uma valorização de status nas compras. Demarcam-se as diferenças através do consumo, mesmo que para isso tenha-se que pagar mais. Comprar determinado carro, celular ou iogurte “separa” seus consumidores das classes sociais “abaixo” deles. A explicação mais importante, porém, não é esta. A baixa competição, a dificuldade de se fazer negócio e o risco mais elevado da atividade empresarial pesam mais.

Burocracia absurda, corrupção, carga tributária elevada, regime tributário complexo, infraestrutura ruim, mão de obra cara e despreparada dificultam a vida das empresas, aumentando o risco de seus investimentos. Com risco maior, empresários reduzem investimentos e, por consequência, a competição. Com menos competição, inclusive com importados – o Brasil é o país com menor taxa de importação de produtos e serviços no planeta – é possível subir preços e aumentar margens de lucro.

Nos últimos anos, as margens no país caíram. Em muitos setores, empresas não conseguiam repassar integralmente aumentos de custos de mão de obra e matéria primas aos preços porque uma competição crescente não permitiu. A competição aumentou porque a crise no mundo desenvolvido estimulou as empresas a buscarem os grandes mercados emergentes. Somou-se a isso um forte crescimento do consumo no país impulsionado pelo aumento da renda e do crédito. Com mercado maior, cresceram os investimentos produtivos e a competição, reduzindo as margens de lucro. Até aí, ótimo.

Acontece que nos últimos trimestres, tal movimento se reverteu. Desvalorizar o Real encareceu importações, inclusive de máquinas e equipamentos, diminuindo a competição e reduzindo investimentos no país. Além disso, ao atacar bancos e empresas de energia elétrica para reduzir rapidamente suas margens de lucro, o governo aumentou o risco dos negócios nesses e em outros setores, que temem medidas semelhantes. Com rentabilidade menor e riscos maiores, investimentos caíram, o que, através da redução da competição, vai aumentar margens de lucros e encarecer preços nos próximos anos. Em economia, às vezes os resultados são o inverso das intenções.

Antes de usar os bancos estatais para pressionar os demais a reduzirem juros – um objetivo louvável, buscado de forma ineficiente – a lucratividade média do setor bancário brasileiro era a segunda mais baixa das Américas, atrás apenas dos EUA, ao contrário do que supõe a maioria. Venezuela e Argentina, onde os governos mais “perseguem” bancos, eram os países com os bancos mais lucrativos. Para reduzir margens e preços, o governo precisa eliminar a burocracia, simplificar a legislação, estimular a competição, evitar o protecionismo, reduzir impostos, inclusive sobre importados e incentivar investimentos. O benefício será dos consumidores.


Por que tudo custa mais caro no Brasil

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18/10/2013 - É tanta muamba que o português dos vendedores de shopping da Flórida está mais afiado do que nunca. Os brasileiros são os turistas que mais compram nos EUA: US$ 4,8 mil por pessoa, à frente dos japoneses.

Nossos gastos no exterior em 2010 tinham passado de US$ 11 bilhões até setembro, um recorde. Agências de turismo já oferecem pacotes sem parques de diversão no roteiro, só com traslados para grandes shoppings e outlets.

Estamos virando um país de contrabandistas. Natural. Veja o caso do iPad. Aqui, nos EUA ou na Europa, ele é importado. Vem da China. Em tese, deveria custar quase igual em todos os países, já que o frete sempre dá mais ou menos a mesma coisa. Mas não. A versão básica custa R$ 800 nos EUA. Aqui a previsão é que ele saia por R$ 1 800. No resto do mundo desenvolvido é raro o iPad passar de R$ 1 000. E isso vale para qualquer coisa. Numa viagem aos EUA dá para comprar um notebook que aqui custa R$ 5 500 por R$ 2 300. Ou um videogame de R$ 500 que bate em R$ 2 mil nos supermercados daqui. E os carros, então? Um Corolla zero custa R$ 28 mil. Reais. Aqui, sai por mais de R$ 60 mil. E ele é tão nacional nos EUA quanto no Brasil. A Toyota fabrica o carro nos dois países.

Por que tanta diferença? Primeiro, os impostos. Quase metade do valor de um carro (40%) vai para o governo na forma de tributos. Nos EUA são 20%. Na China também. Na Argentina, 24%. O padrão se repete com os outros produtos. E haja tributo. Enquanto o padrão global é ter um imposto específico para o consumo, aqui são 6 - IPI, ICMS, ISS, Cide, IOF, Cofins. Ufa. Essa confusão abre alas para uma sandice que outros países evitam: a cobrança de impostos em cascata. O ICMS, por exemplo, incide sobre o Cofins e o PIS. Ou seja: você paga imposto sobre imposto que já tinha sido pago lá atrás. Tudo fica mais caro. E quando você soma isso ao fato de que não, não somos um país rico, o vexame é maior ainda. Levando em conta o salário médio nas metrópoles e o preço das coisas, um sujeito de Nova York precisa trabalhar 9 horas para comprar um iPod Nano (R$ 256 lá). Nas maiores capitais do Brasil, um Nano vale 7 dias de trabalho do cidadão médio (R$ 549).

A bagunça tributária do Brasil não é novidade. A diferença é que os efeitos dela ficam mais claros agora, já que existem mais produtos globalizados (Corolla, iPad...) e o real valorizado aumenta o nosso poder de compra lá fora (quando a nossa moeda não valia nada, antes de 1994, era como se vivêssemos em outra galáxia - não dava para fazer comparações).

Mas sozinho o imposto não explica tudo. Outra razão importante para a disparidade de preços é a busca por status. Mercado de luxo existe desde o Egito antigo. Mas no nosso caso virou aberração. Tênis e roupas de marcas populares lá fora são artigos finos nos shoppings daqui, já que a mesma calça que custa R$ 150 lá fora sai por R$ 600 no Brasil. O Smart é um carrinho de molecada na Europa, um popular. Aqui virou um Rolex motorizado - um jeito de mostrar que você tem R$ 60 mil sobrando. O irônico é que o preço alto vira uma razão para consumir a coisa. Às vezes, a única razão. Como realmente estamos ficando mais ricos (a renda per capita cresceu 20% acima da inflação nos últimos 10 anos), a demanda por produtos de preços irreais continua forte. Os lucros que o comércio tem com eles também. E as compras lá fora idem.

O resultado mais sombrio disso é o que os economistas chamam de doença holandesa: o país enriquece vendendo matéria-prima e deixa de fabricar itens sofisticados - importa tudo (ou vai passar o feriado em Miami e volta carregado). Por isso mesmo o governo reclama da desvalorização excessiva do dólar e do euro, que deixa tudo ainda mais barato lá fora. Aí não há indústria que aguente.

Mas tem um outro lado aí. "É interessante ver que parte da indústria importa bens intermediários, que são usados para fazer outros produtos. E agora eles serão mais baratos. Então o câmbio apreciado pode ser bom", diz o economista Carlos Eduardo Gonçalves, da USP.

O governo também tem agido contra o mal do câmbio. Em agosto, cortou várias taxas de máquinas industriais e zerou os impostos para a fabricação de aviões. Outros 116 bens da indústria de autopeças que não têm similar nacional tiveram seu imposto de importação praticamente zerado. Já é um começo. Esperamos que, em breve, passar 9 horas no avião para comprar um laptop possa deixar de fazer sentido. Porque é bizonho.

Quer pagar quanto?

Preços de alguns produtos no Brasil e nos EUA, em reais:

Hyundai Veracruz
EUA - R$ 48 mil
Brasil - R$ 150 mil

Playstation 3
EUA - R$ 500
Brasil - R$ 1 999

Perfume CK One 200 ml
EUA - R$ 50
Brasil - R$ 299

Carrinho de bebê Chicco
EUA - R$ 500
Brasil - R$ 1 849

PARTE 2