RELIGIÃO, CULTOS E OUTROS

O Cardeal Pell é o responsável por um documento de análise rigorosa acerca do período de liderança do Papa Francisco

morancri113/01/2023 - O Cardeal George Pell redigiu um memorando de crítica referente ao período de liderança do Papa Francisco. O memorando do Cardeal australiano, que faleceu em Roma em 10 de janeiro de 2023, foi publicado por Sandro Magister, um especialista em assuntos do Vaticano, em seu blog "Settimo Cielo" em 15 de março de 2022, durante o período da Quaresma. Naquela ocasião, o documento estava assinado sob o pseudônimo "Demos" (representando o povo). Em 11 de janeiro de 2023, um dia após a morte de Pell, Magister anunciou que Pell foi o autor do memorando previamente assinado como "Demos". Esse memorando circulou entre os cardeais durante a primavera anterior, em preparação para um futuro conclave. O documento se divide em duas partes: "O Estado do Vaticano Atualmente" e ...

"O Próximo Conclave". No início do texto, Pell afirmou que, de acordo com comentaristas de várias correntes, com exceção possivelmente do padre Antonio Spadaro, SJ, este pontificado é considerado desastroso em muitos aspectos, chegando a ser uma catástrofe. No memorando, o Cardeal expressa que "o sucessor de São Pedro é a base sobre a qual a Igreja está construída, representando uma grande ...

fonte de unidade global". Ele observa que, em tempos passados, o lema era "Roma locuta. Causa finita est" (Roma falou, a discussão terminou), enquanto agora é "Roma loquitur. Confusio augetur" (Roma fala. A confusão aumenta).

Pell também discute o Caminho Sinodal da Igreja na Alemanha, um processo iniciado em 2018, que aborda questões como homossexualidade, ordenação de mulheres e comunhão para divorciados recasados. No entanto, ele alega que o papado permanece em silêncio.

Ele destaca a necessidade de a Congregação para a Doutrina da Fé tomar medidas e se pronunciar, especialmente em relação às declarações contrárias à doutrina católica feitas pelo Cardeal Jean Claude Hollerich, o relator geral do Sínodo dos Bispos sobre a sinodalidade.

De acordo com o Cardeal Pell, durante este pontificado, a centralidade de Cristo no ensino da Igreja enfraqueceu, com Cristo sendo relegado de seu lugar central.

Pell também argumenta que a presença da Pachamama no Vaticano durante o Sínodo da Amazônia em outubro de 2019 foi uma forma de idolatria, embora essa questão possa não ter sido inicialmente compreendida como tal.

O Cardeal Pell também lamenta que as freiras contemplativas estejam sendo perseguidas neste pontificado e que existam tentativas de alterar os ensinamentos dos movimentos carismáticos. Ele menciona que a herança cristocêntrica deixada por São João Paulo II na fé e na moral está sendo alvo de ataques sistemáticos, com a demissão de muitos professores do Instituto Romano para a Família e a partida da maioria dos estudantes.

No decorrer de 2019, a Santa Sé efetuou alterações nos estatutos do Instituto Pontifício João Paulo II para o Matrimônio e a Família, o que levou centenas de estudantes a expressarem preocupação, enquanto algumas autoridades denunciaram essas mudanças como uma ameaça à preservação do legado do santo polonês.

O Cardeal Pell também observou que a Academia para a Vida enfrenta sérios problemas, incluindo o apoio de alguns de seus membros ao suicídio assistido. Além disso, destacou que nas Academias Pontifícias, existem palestrantes convidados que endossam o aborto.

Há algum tempo, a Pontifícia Academia para a Vida (PAV), instituída por São João Paulo II, tem promovido uma "reformulação de paradigma" na teologia moral, que implica uma afastamento dos princípios católicos sobre a contracepção e a eutanásia.

Em julho, a PAV publicou um livro intitulado "Ética Teológica da Vida: Escritura, Tradição e Desafios Práticos" (ainda não disponível em todas as línguas), cujo conteúdo se opõe ao Magistério da Igreja.

Decisões “politicamente corretas”

O Cardeal australiano expressou que "a influência política do Papa Francisco e do Vaticano é mínima. Do ponto de vista intelectual, as escritas papais revelam uma diminuição comparada aos níveis de São João Paulo II e do Papa Bento XVI."

Ele prosseguiu, destacando que "as decisões e políticas frequentemente seguem a linha do 'politicamente correto', porém, houve sérias falhas na defesa dos direitos humanos, notadamente na Venezuela, Hong Kong, China continental e mais recentemente durante a invasão russa na Ucrânia."

O Cardeal também mencionou que "a crise da COVID-19 ofuscou a notável queda no número de peregrinos presentes nas audiências papais e nas missas."

"O Papa não goza de grande apoio entre os seminaristas e jovens sacerdotes, e existe uma insatisfação generalizada na cúria vaticana", acrescentou Pell.

No memorando, o Cardeal Pell expressou que "a falta de respeito pela lei no Vaticano ameaça tornar-se um escândalo internacional. Essas questões se tornaram evidentes no decorrer do processo em andamento no Vaticano, que envolve dez acusados de negligência financeira, mas o problema é mais profundo e antigo."

Após observar que "o Papa alterou a legislação quatro vezes durante o processo para favorecer a acusação", o Cardeal lamentou que "o Cardeal Becciu não tenha sido tratado com justiça, uma vez que foi destituído de seu cargo e privado de sua dignidade cardinalícia sem evidências substanciais. Ele não recebeu um julgamento equitativo. Todos têm direito a um julgamento justo."

O Cardeal Angelo Becciu ocupou o cargo de Substituto da Secretaria de Estado da Santa Sé desde 2011 e foi nomeado Cardeal pelo Papa Francisco em 2018. Ele também foi designado Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos.

Becciu permaneceu no cargo até 2020, quando sua renúncia foi aceita pelo Papa Francisco após acusações de corrupção, levando-o a enfrentar um julgamento. Além disso, o Papa retirou seus direitos cardinalícios, incluindo a participação em futuros conclaves para eleger o próximo Papa.

No memorando, o Cardeal Pell destacou que "como líder do Estado do Vaticano e a fonte de toda autoridade legal, o Papa usou esse poder para interferir nos processos judiciais."

"Efetivamente, o Papa em muitas ocasiões governa através de decretos papais, motu proprio, que suprimem o direito de apelação das partes afetadas", acrescentou.

Ele também apontou que "várias vezes, membros da equipe, frequentemente sacerdotes, foram rapidamente demitidos da Cúria Vaticana, muitas vezes sem justificativa adequada." Pell ainda observou que "a escuta de conversas telefônicas ocorre regularmente, embora não haja clareza sobre quão frequentemente isso é autorizado."

A “grave” situação econômica do Vaticano

"A situação financeira do Vaticano é altamente preocupante. Ao longo dos últimos dez anos, quase invariavelmente, foram registrados desequilíbrios financeiros. Antes da pandemia da COVID-19, esses déficits giravam em torno de 20 milhões de euros anualmente", relata o ex-responsável pela secretaria de Economia da Santa Sé.

"Nos últimos três anos, observamos um aumento para cerca de 30 a 35 milhões de euros anuais. Os desafios remontam a um período anterior aos papados do Papa Francisco e do Papa Bento", acrescentou.

Ao abordar a séria questão relacionada ao fundo de pensões do Vaticano, o cardeal destacou que "o papel em constante evolução do Papa Francisco nas reformas financeiras" permanece "um enigma".

"No início, o Sumo Pontífice apoiou vigorosamente as reformas. Entretanto, posteriormente, ele se opôs à centralização dos investimentos, resistiu às mudanças e à maioria das iniciativas para expor a corrupção, além de defender o então arcebispo Becciu, que ocupava uma posição central no cenário financeiro do Vaticano", comentou o cardeal.

"Os auditores da empresa Price Waterhouse e Cooper foram afastados, e o auditor-geral Libero Milone foi forçado a renunciar em 2017 com acusações infundadas. Eles estavam se aproximando demais das irregularidades na Secretaria de Estado", prosseguiu.

 

O próximo conclave

A segunda parte do comunicado do cardeal Pell aborda o próximo conclave.

"O Colégio dos Cardeais foi enfraquecido por nomeações pouco convencionais" e "muitos cardeais são desconhecidos entre si, o que acrescenta uma nova camada de imprevisibilidade ao futuro conclave", afirmou o cardeal australiano.

"Estamos em uma posição menos robusta do que há cinco décadas, e diversos fatores que não controlamos, pelo menos no curto prazo, como a diminuição no número de fiéis, a frequência nas celebrações litúrgicas, bem como o declínio ou extinção de diversas ordens religiosas, impactam nossa situação", continuou Pell.

"O futuro papa deve compreender que a vitalidade da fé cristã e católica é sustentada pela aderência aos ensinamentos de Cristo e às tradições católicas, não pela conformidade com as tendências mundanas ou pelo poder financeiro", enfatizou Pell.

Após discutir as preocupações em relação aos sínodos nacionais ou continentais, Pell encoraja a correção de "doutrinas errôneas" e a ênfase na doutrina católica, mencionando como um dos pontos cruciais a "moralidade das relações homossexuais".

O cardeal Pell também alerta para o risco de um cisma, embora ele não o veja surgindo da "ala progressista", mas sim da "ala conservadora", explicando que "isso se torna uma possibilidade sempre que as tensões em relação à liturgia não são amenizadas".

Visita apostólica aos jesuítas

O cardeal propõe ainda uma visita ou investigação apostólica à Companhia de Jesus (jesuítas), devido à sua relevância e porque "a Ordem é altamente centralizada, suscetível a mudanças significativas ou a potenciais problemas que possam surgir de lideranças superiores".

Nos últimos tempos, os jesuítas têm estado no centro das atenções devido ao caso do padre e artista esloveno Marko Rupnik, que enfrentou alegações de má conduta com freiras adultas. Esse escândalo veio à tona na imprensa italiana no início de dezembro e ainda não foi completamente esclarecido.

O cardeal também instou a lidar com a preocupante diminuição do número de católicos e o aumento da presença de grupos protestantes na América do Sul. Essas questões receberam pouca atenção durante o Sínodo da Amazônia, que ocorreu no Vaticano em outubro de 2019. Para a maioria dos bispos participantes, as questões centrais eram a possibilidade de permitir o casamento de padres e a ordenação de diaconisas.

REFERENCIAS:     INSTITUTO HUMANITAS UNISSINOS

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