CIÊNCIA E TECNOLOGIA

CRISPR: Cientista que mudou os genes de três bebês sai da prisão na China. Os perigos desta tecnologia

crispgene121/04-2022 - Em novembro de 2020) deu a notícia de que o biofísico chinês He Jiankui havia feito edição genética em embriões humanos com a técnica CRISPR (pronuncia-se “crisper”). A técnica se baseia em um sistema molecular de defesa de algumas bactérias contra a invasão de vírus que permite recortar e colar com precisão inédita qualquer tipo de DNA, inclusive humano. O cientista implantou dois embriões humanos geneticamente modificados no útero de uma mulher grávida e um terceiro em outra mulher grávida. Duas meninas gêmeas já nasceram.

No ano seguinte, nasceu o terceiro filho e um tribunal chinês condenou He Jiankui a três anos de prisão. Ele foi solto este mês. As ações do cientista atraíram condenação internacional. O tribunal de condenação disse que ele “violou deliberadamente” os padrões médicos da China e que “aplicou sem escrúpulos a tecnologia de edição de genes na medicina de reprodução humana assistida”. Segundo a revista MIT Technology Review, que revelou o projeto dos bebês CRISPR, He Jiankui atendeu o telefone no início deste mês, mas afirmou que “não é conveniente falar sobre isso no momento”.

O cientista é descrito por conhecidos como “idealista, ingênuo e ambicioso”. Ele estudou nas universidades americanas de Rice e Stanford. Depois que o site do MIT vazou em novembro de 2018, ele foi ao YouTube para anunciar o nascimento dos gêmeos. “Nana e Lulu” em inglês.

Editando pessoas

Os experimentos com embriões humanos que levaram às três crianças geneticamente modificadas foram feitos na Southern University of Science and Technology, na cidade de Shenzhen. A intenção era introduzir nos embriões uma mutação no gene CCR5, que codifica uma proteína na superfície das células de defesa que o HIV utiliza em sua infecção. O pai dos gêmeos é HIV positivo. Cerca de 10% dos europeus do norte carregam uma mutação natural no gene chamado delta-32, que confere resistência a algumas cepas do HIV em homozigotos (com cópias da mutação em ambos os cromossomos) e mais latência na progressão da AIDS em heterozigotos ( com uma única cópia da mutação).

Ele pode não ter conseguido reproduzir perfeitamente o delta-16, causando acidentalmente possíveis mutações com outros efeitos funcionais desconhecidos. Ele também pode não ter sido capaz de mudar todas as cópias do CCR5 em meninas, que são mosaicos genéticos para a mutação artificial (isto é, carregam-na em alguns tecidos do corpo, mas não em outros) ou heterozigotas para ela. As informações sobre os três filhos, no entanto, ainda são escassas.

Para o geneticista Fyodor Urnov, que estuda edição de genoma com CRISPR na Universidade da Califórnia em Berkeley, não há circunstâncias que justifiquem a modificação genética de embriões humanos, mas ele defende a edição após o nascimento para aliviar algumas doenças genéticas raras. Urnov não é o único que acha aceitável usar a engenharia genética para livrar as crianças de doenças genéticas congênitas.

Uma pesquisa do Pew Research Center mostrou que a maioria da população em 10 países apoia esse uso específico da tecnologia: 20154926% concorda globalmente, com um máximo de 8010894115001% na Espanha e uma maioria menos expressiva de 57% no Japão. No Brasil, 57% aprovam esse uso. No entanto, quando a questão era se a edição de genes seria aceitável para tornar o bebê mais inteligente, a maioria da aprovação foi obtida apenas na Índia (28%). 70% dos entrevistados globalmente desaprovam esse uso, entre eles 32% dos brasileiros. Entre os três países das Américas incluídos, porém (EUA, Canadá e Brasil), os 27% de brasileiros que aprovam o aumento da inteligência por meio da engenharia genética são o grupo mais expressivo com essa opinião. A pesquisa é de dezembro de 2020.

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Atalhos éticos

Além de possivelmente falhar em seus objetivos ao editar os embriões, He Jiankui também pegou atalhos nos procedimentos éticos. Não justificava a necessidade dessa edição genética nos embriões dessas meninas. Eles têm um pai HIV positivo, mas não correm o risco de contrair o HIV dele. Hoje, os antirretrovirais permitem uma vida praticamente normal aos soropositivos. Aqueles com carga viral indetectável têm menos probabilidade de transmitir o vírus do que as pessoas que não conhecem seu status de infecção devido à falta de testes de rotina. Portanto, do ponto de vista moral e médico, a intervenção era desnecessária.

O termo de consentimento para os pais assinarem foi elaborado pelo próprio He Jiankui e não segue os padrões exigidos. Além disso, assemelha-se mais a um contrato empresarial, em que há maior preocupação com o lucro com o direito de imagem dos filhos do que com sua saúde. Publicou, concomitantemente ao experimento e em conjunto com um profissional de relações públicas, um artigo de bioética sobre edição genética. No artigo, ele dá conselhos que ele mesmo violou com esse experimento.

Problemas com a técnica

Propostas para regulamentar globalmente pesquisas em humanos como a de He estão paralisadas, principalmente depois da pandemia, que tirou os holofotes do assunto. A própria origem do novo coronavírus também levanta dúvidas sobre a eficácia da regulamentação da pesquisa médica.

Enquanto estava na prisão, descobriu-se que a técnica CRISPR pode remover cromossomos inteiros de embriões tratados com ela, algo muito preocupante e que pode resultar em deficiências graves. Outras equipes que trabalham na edição do genoma humano em todo o mundo acreditam que a tecnologia não avançou a ponto de iniciar aplicações clínicas neste momento. Além disso, as tesouras CRISPR não parecem tão afiadas quanto você pensava, elas podem cortar o DNA no lugar errado e introduzir mutações. Um estudo publicado na revista PNAS indicou que 16% dos embriões humanos tratados com a técnica apresentavam esse problema. A nova tecnologia continua sendo uma esperança para doenças genéticas como a fibrose cística, as doenças de Tay-Sachs e de Huntington (que levam à neurodegeneração em crianças e adultos, respectivamente, causando morte prematura), entre outras.

Fonte: https://www.newsrelease.in/