CURIOSIDADES

Intolerância à lactose

lactose1aEm palestras e aulas para o público vegano, sempre que falo sobre leite e possíveis problemas associados a ele, algumas pessoas ficam na expectativa de que vou tentar associá-lo às piores condições de saúde, mas saem frustradas com isso. Por isso, antes de começar a falar sobre o assunto, quero deixar alguns pontos bem claros. Eu sou vegetariano estrito e, portanto, não uso leite e derivados. Isso é uma opção pessoal, por diversos motivos. No entanto, meu compromisso de abordagem ao escrever sobre esse assunto aqui, ou ao atender alguém, é único e simplesmente médico, sem vínculos emocionais e pessoais.

O médico tem o dever de avaliar o indivíduo e verificar se há problema quando a pessoa utiliza ou não laticínios. A decisão de manter seu uso ou não, faz parte do princípio da autonomia do paciente. Assim, o médico avalia e propõe a terapia necessária. O paciente escolhe se vai aceitar a abordagem ou não.


Há inúmeras razões, do ponto de vista ético e ambiental, para abolir o consumo de leite e derivados, mas do ponto de vista de saúde, há muita coisa a ser dita, nem sempre negativa. Portanto, irei trabalhar aqui com conhecimentos médicos e nutricionais, abordando conceitos e possibilidades terapêuticas referentes à intolerância à lactose. E atenção: alergia ao leite de vaca é diferente de intolerância à lactose.


O que é a lactose


Lactose é um tipo de carboidrato, primo da sacarose (açúcar comum). Enquanto a sacarose corresponde à união de uma glicose com uma frutose, a lactose é a junção de uma glicose com uma galactose. Repare que a forma simples do carboidrato é a glicose, frutose e a galactose. Esses compostos podem ser unidos de murtas formas diferentes, resultando em produtos diferentes, como a lactose.


A digestão da lactose


Ao ingerir a lactose, o organismo vai separar a glicose da galactose, pois são eles que serão usados para o nosso metabolismo. Quem faz essa separação é uma enzima chamada lactase, cujo nome técnico é /3-D-Galactosidase. Portanto, a lactase é necessária para "quebrar" a lactose em glicose e galactose.


Quando falta a lactase..


Intolerância à lactose é uma incapacidade de digerir lactose, por falta total ou parcial da enzima lactase. Há alguns motivos que levam à falta de lactase, mas seja lá qual for o motivo, o resultado final é parecido.

Faltando lactase, a lactose permanece lactose, ou seja, não é separada em glicose e galactose para ser absorvida (do intestino para o sangue). Assim, essa lactose vai percorrendo o intestino delgado e chega ao grosso para depois, talvez, ser eliminada pelas fezes. Só que isso não acontece sem consequências. Um dos problemas é que a lactose, assim como qualquer carboidrato não digerido, faz com que o líquido do organismo seja "puxado" para o intestino, estimulando seus movimentos ("acelerando" o intestino) e favorecendo o surgimento de diarréia. Além disso, as bactérias intestinais adoram a lactose, e fazem uma festa quando encontram com ela. Essa festa se traduz em um processo de fermentação (produzindo ácido lático), onde as bactérias utilizam a lactose como alimento e geram muitos gazes, inclusive hidrogênio, que poderá ser usado para o diagnóstico.


Tipos de intolerância

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Pode haver um defeito genético onde a criança nasce sem a capacidade de produzir lactase. Isso é muito grave, pois como o leite materno (rico em lactose) é o principal alimento do bebê, ele terá sérias consequências, podendo inclusive morrer; se não diagnosticado e tratado a tempo. A intolerância à lactose pode ocorrer também na criança ou adulto devido a doenças intestinais, inclusive parasitoses. Nessas situações, as células do intestino que produzem a lactase ficam lesadas, e há deficiência temporária na produção de lactase, que volta ao normal após resolução do problema. Esse é um dos motivos para contra indicar leite e derivados quando há diarréia.

Outra forma de intolerância é a chamada ontogenética (relativa ao crescimento e desenvolvimento do indivíduo), ou deficiência primária. Nessa condição, com o avançar da idade, a pessoa tem uma tendência natural de produzir menos lactase, já que a fase que produzimos mais lactase é até os 2 anos de idade.


Prevalência de intolerância à lactose no mundo


Segundo alguns estudos, isso ocorre com 90% dos asiáticos, 80% dos negros e 15% a 20% dos brancos adultos. Há estudos que apontam que 70% da população mundial têm algum grau de intolerância à lactose. Um estudo realizado em Joinville, avaliando 1.088 pessoas com distúrbios gastrointestinais, ou com manifestações clínicas suspeitas de intolerância à lactose, detectou que 44,1 I % desses indivíduos eram intolerantes à lactose, 18,29% não eram totalmente intolerantes, mas absorviam mal a lactose e 37,60% foram classificados como normais, pois absorviam bem a lactose.

 

Sintomas da  intolerância à lactose

Os sintomas mais comuns de intolerância à lactose são:

Náuseas;

Dores abdominais;

Gazes;

Diarreia ácida;

Distensão abdominal (estufamento);

Desconforto abdominal.

Esses sintomas não precisam estar todos juntos, podendo ocorrer, por exemplo, apenas dor e distensão abdominal, sem diarréia. Os sintomas podem demorar minutos a horas para aparecer após a ingestão do alimento contendo lactose.

Texto estraído da Revista dos Vegetarianos -Edição 53- março 2011

 Dr.Eric Slywitch- CRM 105.231-É médico especialista em nutrologia, nutrição enteral e parenteral. Especialista em nutrição vegetariana. Autor dos livros “Alimentação sem carne- Guia Prático” e “Virei vegetariano. E agora?”. Coordenador do Departamento de Medicina e Nutrição da Sociedade Vegetariana Brasileira. Pós- graduado em nutrição clínica (GANEP) e Mestre em nutrição (UNIFESP/EPM).