QUALIDADE DE VIDA

Alimentos Trângenicos - Parte 5

transgenicos6Quais são as polêmicas? - São muitos os aspectos que causam polêmica quando falamos de transgênicos. As principais são as conseqüências da liberação de plantas transgênicas no ambiente, e os danos que esses alimentos poderiam estar trazendo à saúde humana e animal. A liberação no ambiente - Quando introduzimos uma espécie diferente em um meio, devemos tomar sempre muito cuidado, pois esse é um processo normalmente irreversível. A reprodução natural de organismos geneticamente modificados poderia causar grandes desastres, já que poderiam entrar em competição com as espécies nativas da região, ou mesmo cruzar com espécies nativas próximas, gerando novas plantas, além de outras possíveis conseqüências imprevisíveis.

Uma das tentativas de solução desse problema por parte das empresas produtoras de sementes geneticamente modificadas foi criar plantas que produzem sementes estéreis, o que também forçaria o produtor a comprar sementes daquela empresa. Mas o cruzamento com plantas nativas e com outras cultivares (contaminação genética) ainda é possível na maioria dos casos, sendo monitorado o desenvolvimento da lavoura, a fim de verificar possíveis cruzamentos indesejáveis.

O monitoramento de biossegurança é feito pela própria empresa, que apresenta um projeto que confirma a segurança das sementes no meio ambiente. Essas pesquisas, de caráter duvidoso, possuem sua metodologia questionada devido a um possível empirismo das mesmas.


Possíveis danos à saúde


Quando um gene é introduzido em uma planta, uma característica favorável pode ser introduzida, mas uma característica indesejável pode também ter entrado. Ou seja, ao mesmo tempo que uma planta adquire resistência a uma doença, ela pode produzir toxinas ao homem.

O problema maior é descobrir exatamente quais características a planta adquiriu com o processo, pois muitas delas são quase ocultas, mas podem ter conseqüências desastrosas.

Existem diversas acusações de intoxicações alimentares causadas supostamente por alimentos transgênicos. Mas é importante observar que ainda não há qualquer prova concreta de que alimentos transgênicos possam causar danos à saúde de humanos e animais. Ao mesmo tempo, não há qualquer prova concreta de que eles não podem causar danos à saúde.


O pagamento de royalties


A permissão da geração de patentes sobre seres vivos é uma das mais importantes pautas da discussão sobre organismos geneticamente modificados. Vale ressaltar que todos os transgênicos produzidos por empresas privadas são patenteados.

Isso significa que a cada vez que algum produtor utiliza sementes transgênicas, eles devem pagar taxas para quem as criou, sendo essas taxas chamadas de royalties. Essa patente vale mesmo para as sementes geradas naquela propriedade rural através da planta transgênica.


O aumento do uso de herbicidas


Muitos tentam comprovar que houve aumento no uso de herbicidas com o uso de transgênicos, e não uma redução, como havia sido dito pelas empresas produtoras de sementes. Algumas cultivares de plantas lançadas eram resistentes a determinados herbicidas, sendo útil para a utilização do herbicida já com a plantação formada, sem causar danos à produtividade.


Falsas argumentações


Muitos radicais favoráveis ao uso de transgênicos na agricultura fazem afirmações que acabam por diminuir os demais argumentos utilizados. Um dos mais fortes argumentos para o uso da transgenia erao fim da fome mundial. Mas é uma ilusão imaginarmos que quem passa fome está assim por falta de alimento produzido, pois há alimento de sobre no mundo. O que ocorre é que as pessoas passam fome devido à pobreza, à falta de dinheiro para comprar os produtos já produzidos.

O uso de organismos geneticamente modificados (transgênicos) na agricultura pode gerar muitos benefícios à população mundial. Apesar disso, ainda há muitas controvérsias sobre a biossegurança da sua liberação no meio ambiente e da sua segurança no consumo alimentício.

São diversos campos de pesquisa relacionados à transgenia: produção agrícola, questões ambientais, medicina e ética. Mas infelizmente, há pouca ou nenhuma integração desses campos de pesquisa para o desenvolvimento e estudo dos OGMs. Uma das grandes barreiras para que isso ocorra, é o radicalismo ideológico que vem sendo apresentado por todas as partes representantes de cada campo de pesquisa, o que gera conflitos, sem se poder chegar a qualquer conclusão.


CAIU O MITO DE QUE OS ALIMENTOS TRANSGÊNICOS SÃO SEGUROS


2004 - Estudo científico ontem publicado prova exactamente o contrário

Um artigo científico publicado ontem na insuspeita revista Biotechnology and Genetic Engineering Reviews deita por terra o mito de que os alimentos e culturas transgénicas são cuidadosamente testados, e aprovados apenas quando há garantias de que sejam seguros.

Este trabalho*, pormenorizada e meticulosamente documentado com cerca de uma centena de referências, demonstra como o milho MON810 da Monsanto (modificado para resistir a certos insectos) foi comercializado nos Estados Unidos da América a partir de 1996 com base em dados experimentais incompletos, errados e até manipulados. Em particular, as provas de que este milho transgénico podia causar alergias alimentares foram ignoradas pela administração americana.

A investigação dos dois autores** expõe falhas de fundo no modo como o governo federal dos EUA regulamenta as plantas geneticamente modificadas (GM) e levanta questões sérias acerca da segurança dos alimentos GM agora vendidos por todo o mundo. Um exemplo dessas falhas, entre muitos apontados: a Environmental Protection Agency (EPA, equivalente ao nosso Ministério do Ambiente) optou por ignorar um estudo realizado por um cientista da Food and Drug Administration (FDA, a agência de segurança alimentar), tendo em vez disso solicitado às empresas em causa (Monsanto e Novartis/Syngenta) que reescrevessem essa mesma análise - obviamente com uma conclusão mais favorável. Noutras instâncias, em que os dados de cientistas independentes se revelaram dissonantes dos apresentados pelas empresas, eles foram simplesmente ignorados.

Ainda mais grave é o facto de a FDA não exigir às empresas que conduzam quaisquer testes na área da segurança alimentar dos transgénicos. Qualquer empresa pode colocar um alimento GM no mercado sem passar por um processo de autorização governamental: o FDA sugere (!) apenas que as empresas consultem este organismo. Este processo de "consulta voluntária" não obriga as empresas a responder s questões que o FDA possa levantar e, no final, o FDA não dá nenhum selo de aprovação ou de segurança ao alimento GM - qualquer questão de segurança alimentar terá de ser directamente tratada entre a empresa e eventuais lesados.

De notar que os EUA são o maior exportador mundial de OGM, sendo responsáveis por 63% do total de OGM cultivados anualmente. Cerca de um terço de todo o milho produzido em solo americano é já geneticamente modificado, estando também presente, como contaminante, na quase totalidade dos lotes dos restantes dois terços.

O milho MON 810 circula desde 1998 na União Europeia, após um processo de aprovação baseado essencialmente nos mesmos (maus) estudos que fizeram fé nos EUA e foram produzidos pela própria Monsanto, precisamente a empresa que tinha a ganhar com a autorização. Particularmente danoso é o facto de a Comissão ter dado, no passado mês de Setembro, luz verde ao cultivo geral de milho transgénico em toda a União Europeia, já a partir de 2005, dando a sua primeira autorização ao... milho MON810. Face às fragilidades evidentes desta variedade transgénica no tocante às suas implicações alimentares e ecológicas, impõe-se a tomada de medidas imediatas.

A Plataforma Transgénicos Fora do Prato*** já enviou um alerta Comissão Europeia (DG Ambiente, DG SANCO e DG AGRI) e ao governo português (Ministérios do Ambiente, da Saúde e da Agricultura) com vista a que sejam imediatamente congelados quaisquer processos de autorização de cultivo deste milho em Portugal e na União Europeia, e que seja suspensa a circulação, para fins de alimentação humana e animal, de matérias primas e produtos que contenham derivados deste OGM (tal como, aliás, está previsto e é obrigatório segundo os artigos 34º do Regulamento (CE) 1829/2003 sobre géneros alimentícios e alimentos para animais geneticamente modificados e 20º da Directiva 2001/18/CE relativa à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados, transposto pelo artigo 23º do Decreto-Lei 72/2003 de 10 de Abril).

Qualquer outra atitude, mais displicente, das autoridades competentes, colocará em perigo a população e ecossistemas europeus e não será aceitável.

* O artigo tem por título "Safety Testing and Regulation of Genetically Engineered Foods" e foi publicado no volume 21 da revista científica "Biotechnology and Genetic Engineering Reviews" a 16 de Novembro de 2004. Os seus autores são os doutores David Schubert e William Freese. Uma versão electrónica do texto completo pode ser solicitada à Plataforma Transgénicos Fora do Prato através do email: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

** O contacto directo com os dois autores do estudo é possível através dos endereços: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. (David Schubert) e Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. (William Freese).

*** A Plataforma 'Transgénicos Fora do Prato' é uma estrutura integrada por oito entidades não-governamentais da área do ambiente e agricultura (Agrobio, Biocoop, Fapas, Gaia, Geota, Liga para a Protecção da Natureza, Liga Portuguesa dos Direitos do Animal e Quercus) e apoiada por dezenas de outras. Para mais informações contactar Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.


Transgênicos - os dois lados da moeda

 

Esqueça a polêmica entre "o bem e o mal". Cada caso é um caso quando se fala em organismos modificados

Cristina Amorim (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.) - Revista Galileu , Novembro 2003 - Número 148

Os transgênicos tomaram o Brasil de assalto. A sociedade testemunha hoje uma discussão incentivada pela produção de soja geneticamente modificada e polarizada entre argumentos contrários e favoráveis.

O que pouca gente sabe é que os transgênicos fazem parte da nossa vida desde a década de 1970, quando foi criada a técnica do DNA recombinante e a engenharia genética produziu um filhote comercial: insulina humana feita por bactérias modificadas, com menor taxa de rejeição entre os diabéticos. Da medicina, a biotecnologia passou para a agricultura, onde proliferou. Segundo o Serviço Internacional para a Aquisição de Aplicações de Agrobiotecnologia, em 1996 havia 1,6 milhão de hectares de transgênicos em todo o mundo; em 2002, o número pulou para 58,7 milhões de hectares.

O campo também viu florescer a polêmica sobre a manipulação genética. De um lado, seus defensores pregam que os organismos geneticamente modificados (OGMs) pedem menos agrotóxicos - como a soja Roundup Ready, da Monsanto - e podem resolver problemas nutricionais - como o 'arroz dourado', que produz vitamina A, cuja deficiência causa cegueira e deixa o corpo vulnerável a infecções. Do outro lado, críticos pedem mais precaução e colocam em xeque os critérios que atestam sua segurança para a saúde e o meio ambiente.

'Há muita paixão nessa conversa', alerta a bióloga Maria Helena Goldman, da USP de Ribeirão Preto. 'Nada é só bom ou só ruim. E os organismos modificados não podem ser generalizados, porque cada caso é um caso', declara.

Conheça nas páginas seguintes os argumentos usados pelos dois lados e o que a ciência já sabe sobre os benefícios e os riscos dos transgênicos.

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Os caminhos dos transgênicos - Da medicina à agricultura, OGMs estão por toda parte

Os transgênicos, ou organismos geneticamente modificados (OGMs), são aqueles com material genético alterado pelo homem de uma maneira que naturalmente não aconteceria. O processo envolve transferência de gene entre espécies similares ou díspares. Em teoria, os cientistas podem misturar o DNA de microorganismos, plantas, animais e até do homem.

As possibilidades são muitas. No Canadá, a empresa Nexia Biotechnologies incluiu um gene da aranha em cabras, a fim de obter seda da teia a partir do leite. No Brasil, a Unicamp criou uma variedade de milho com um gene do homem capaz de produzir o hormônio do crescimento humano. Esses são exemplos de 'fábricas celulares', ou biorreatores.

Outra aplicação da engenharia genética é a criação de cobaias específicas para testes em laboratório. Na Unifesp, pesquisadores desenvolvem animais para o estudo de doenças como hipertensão, câncer e diabetes ao adicionar ou retirar um DNA relacionado à característica que precisa ser estudada.

Alterações na mesa

A principal polêmica diz respeito à inclusão dos OGMs no sistema alimentar. Soja, milho, canola e arroz estão entre as culturas de grande extensão, commodities da indústria alimentícia mundial, que sofreram alterações em sua estrutura.

Ainda que existam outros métodos de melhoramento do alimento, como o cruzamento de espécies selvagens, a engenharia genética tende a ser mais precisa. 'Há incertezas quanto ao resultado, assim como não se sabe o que vai acontecer no cruzamento', explica o professor Flavio Finardi, do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da USP. 'Mas a engenharia genética é mais dirigida do que o processo normal.' A indústria também defende a capacidade de incluir genes de resistência a agrotóxicos e a pragas, como é o caso dos grãos Bt. Eles possuem um gene da bactéria Bacillus thuringiensis que produz uma toxina letal para os insetos que atacam a planta.

As empresas afirmam garantir a segurança do que desenvolvem, porém isso não é um consenso. Uma consulta feita no Reino Unido mostrou rejeição dos britânicos: 93% dos entrevistados afirmam que o desenvolvimento dos OGMs é guiado pelo lucro, não pelo interesse público, e a maioria pede mais tempo e precaução antes de seu consumo.

'A biotecnologia saiu das mãos da comunidade científica e foi para as mãos do mercado, porque um dia ela tem de ser comercializada', afirma Paola Cardarelli, do Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde da Fiocruz. 'Mas não se sabe se todos os estudos foram feitos ou se mais poderiam ser conduzidos.'

Se há dúvidas quanto à liberação de transgênicos, elas deveriam ser sanadas pelo governo. 'Cabe aos órgãos públicos analisar se os benefícios compensam o risco da introdução prematura dessa tecnologia', avalia a bióloga Maria Alice Garcia, do Instituto de Biologia da Unicamp.

No Brasil, a Lei 8.974, de 1995, conhecida como Lei da Biossegurança, normatiza o uso da engenharia genética e a liberação no meio ambiente de OGMs, além de autorizar a criação da CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança), que concede pareceres sobre culturas experimentais e comerciais.

Desde 1998, uma liminar proíbe o cultivo comercial de OGMs no país sem estudos prévios de impacto ambiental - exigência desrespeitada pelos produtores de soja no Sul. Ainda assim, a legislação brasileira relacionada a transgênicos - especialmente a Lei de Biossegurança - é vista por muitos cientistas como uma das mais completas do mundo. Resta aplicá-la.

A soja da discórdia

Ainda que a plantação comercial de transgênicos seja proibida no país, brasileiros têm importado ilegalmente sementes de soja argentinas. Apelidada de 'Maradona', ela é uma variação da Roundup Ready, da Monsanto. O Ministério da Agricultura calcula que 70% da área plantada de soja no Rio Grande do Sul contenha OGM.

Em março, com a safra 2003 colhida, uma medida provisória foi publicada para permitir sua comercialização - nela eram previstas punições a quem plantasse mais transgênicos. Alguns meses depois, a pressão do setor, nutrida pela demora do governo em definir uma posição clara, mostrou-se mais forte do que a oposição de ambientalistas, do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e a liminar que proíbe a prática no Brasil. Em setembro, outra medida provisória, a 131, liberou o cultivo e a comercialização da nova safra transgênica.

'Eram necessários estudos de impacto ambiental para obter o licenciamento da soja', afirma Marijane Lisboa, secretária de Qualidade Ambiental nos Assentamentos Humanos do MMA. 'O governo precisava se posicionar sobre a situação no Sul', rebate João Henrique Vieira, da Secretaria Executiva do Ministério da Agricultura.

Além de paliativa, a medida é incompleta. A vantagem da soja RR é sua resistência ao glifosato. Porém, no Brasil esse herbicida não pode ser lançado em folhas e ramos - apenas no solo -, pois está relacionado a problemas de saúde em agricultores.

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Saúde no centro do debate - Afinal, os transgê nicos fazem mal ou não?

Se comer transgênicos o preocupa, a boa notícia é que desde 1996, quando os OGMs chegaram ao mercado norte-americano, milhões de pessoas consumiram esses produtos sem que uma onda de doenças tenha varrido o país. A má notícia é que ninguém sabe ao certo o que pode acontecer no futuro. Os transgênicos, como frutos da biotecnologia, podem estar sujeitos a variações não-previstas ou detectadas em curto e médio prazo.

Em 1989, uma epidemia da síndrome de eosinofilia-mialgia (que provoca dor muscular e aumento dos leucócitos) causou a morte de 37 pessoas e a invalidez de outras 1.500 nos EUA. O FDA, agência americana que regula remédios e alimentos, ligou os casos a um complemento alimentar, o triptofano L, produzido por bactérias geneticamente modificadas. Os testes prévios realizados pelo fabricante, a empresa japonesa Showa-Denko, não haviam detectado a capacidade de essa bactéria criar um aminoácido extremamente tóxico.

Desde então, o exame dos OGMs evoluiu. 'A análise varia de acordo com a planta e a característica', afirma o coordenador de projetos da Embrapa Recursos Genéticos, Elíbio Rech. Nesse processo, foi interrompido o desenvolvimento de uma variedade de soja com um gene da castanha-do-pará no Brasil, mais eficiente para a alimentação do gado. Como havia um histórico de alergia ao fruto, foram feitos testes com a soja modificada e o soro de pessoas alérgicas e ocor-reu a mesma reação.

Se for aprovado nos exames, o produto é então liberado para comercialização. É quando ele deve ser monitorado para, se aparecerem efeitos não-intencionais, a causa seja rastreada. 'Quando se modifica o DNA, você cria uma característica específica, mas também pode produzir algo que não foi previsto', diz Paola Cardarelli, da Fiocruz.

Perigo na mesa

Há dois pontos especialmente focados nos testes que garantem a segurança alimentar dos OGMs: toxicidade e alergia.

A Organização Mundial de Saúde desencoraja o uso de genes provenientes de alimentos reconhecidamente alergênicos, como leite, ovos, pescados, crustáceos, trigo, nozes e leguminosas como soja e amendoim. Esses grupos são responsáveis por 90% dos casos de alergia que atingem cerca de 2% da população mundial e, portanto, conhecidos pelos pesquisadores. Mesmo a ingestão de pequenas quantidades dessas substâncias por pessoas alérgicas pode provocar de sintomas leves, como lesões na pele, a choques anafiláticos.

Fora desses grupos, os testes de alergia buscam analogias com seqüências de aminoácidos que reconhecidamente podem causar danos à saúde. 'Se não houver nada conhecido, são feitos ensaios com animais', explica Cardarelli.

O mesmo vale para exames que buscam novas toxinas no transgênico. A técnica poderia provocar variações no genoma e causar a ativação - ou o silenciamento - de alguns genes, com conseqüências imprevisíveis como o caso do triptofano L descrito acima.

Se por um lado os OGMs preocupam, por outro eles prometem ser a coqueluche da saúde pública em um futuro não muito distante.

Bactérias modificadas já produzem alguns hormônios e vacinas em escala industrial. Diversas pesquisas têm sido desenvolvidas nesse sentido. A Embrapa e a Universidade Federal de Minas Gerais introduziram no alface um gene no antígeno da leishmaniose, doença infecciosa endêmica no país, para imunizar quem comer a salada transgênica.

O valor nutricional dos alimentos também está no alvo dos biotecnólogos. O 'arroz dourado', um coquetel com DNA de ervilha, narciso, um vírus e uma bactéria, rico em vitamina A, é o caso mais conhecido. Ele foi desenvolvido para o consumo por populações caren-tes como as da Ásia, onde o arroz é fonte de alimento para bilhões de pessoas.

Essa face da engenharia genética não costuma sofrer as mesmas críticas que a sua utilização agrícola. A diferença começa no investimento. Enquanto os biofármacos se reproduzem em centros de pesquisa acadêmicos e estatais, as multinacionais focam os grãos cujas patentes rendem dividendos milionários. 'Se você analisar quem se beneficia com essa tecnologia, feita a toque de caixa, não é a população, não é o agricultor, não é o meio ambiente, não é a saúde pública, nenhum desses fatores', examina Maria Alice Garcia, da Unicamp.

Os OGMs e a luta contra a fome

Pelo menos 800 milhões de pessoas passam fome no mundo, segundo o Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas. O número desafia os questionamentos sobre a importância dos organismos geneticamente modificados.

Alguns países da África recusaram toneladas de milho transgênico doadas pelos Estados Unidos. O presidente americano George W. Bush chiou e acusou a União Européia - que exige rotulagem em carregamentos que contenham mais de 0,9% de transgênicos - de incentivar a recusa africana. O governo da Zâmbia afirma que não alimentará o povo com OGMs enquanto não houver estudos definitivos sobre a ausência de danos à saúde e à biodiversidade.

Espera-se que a engenharia genética repita o êxito agrícola obtido pela 'Revolução Verde', a qual aumentou a produção mundial de cereais a partir da década de 1950. Porém, o combate à fome não se limita a mais comida: ele também exige melhor distribuição de renda e acesso ao alimento.

Além disso, de pouco adianta alimentar mal os famintos. Os espe-cialistas sustentam que apenas o 'arroz dourado', com betacaroteno, não vai solucionar a deficiência nutritiva que vitima milhões de pessoas.

Mais: pesquisas têm demonstrado que os OGMs apresentam produtividade mais baixa - compensada para o agricultor pela rentabilidade. Um estudo realizado em 2001 na Universidade de Saskatchewan, no Canadá, mostrou que a canola transgênica é 7,5% menos produtiva que a variedade convencional.

'Não conheço nenhuma tecnologia que em um passe de mágica resolva os problemas do mundo', afirma Macelo Menossi, da Unicamp. 'Esse é um reducionismo daninho para o avanço da ciência. Os transgênicos são apenas uma ferramenta a mais no combate à fome.'

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Meio ambiente em clima de competição - Faltam estudos conclusivos sobre o risco

O México é o centro de origem do milho. Há dezenas de variedades no país, as quais representam a base financeira para milhares de famílias. O milho é tão importante para os mexicanos que ultrapassa a questão econômica e assume feições culturais.

Para proteger esse tesouro genético, o governo do México baniu, em 1998, o cultivo de versões transgênicas da planta - que tem polinização cruzada - para impedir a contaminação das variedades nativas.

Neste ano, exames conduzidos por comunidades indígenas e camponesas descobriram DNA de milho transgênico em pelo menos nove Estados produtores. Entre eles, está a proteína Bt-Cry9c, que identifica o milho Starlink, da Aventis. O grão é plantado nos Estados Unidos como fonte de alimentação animal, mas é proibido para o consumo humano. As causas da contaminação ainda não estão claras, mas sabe-se que o pólen do milho pode viajar pelo vento. 'Há também o fator 'semente no bolso' ', recorda o bióloga Vera Lúcia Imperatriz Fonseca, integrante da CTNBio. 'Um pequeno produtor pode ter levado uma semente inocentemente para o país, sem nem pensar nas conseqüências.'

O caso do México ilustra os riscos que os OGMs oferecem à natureza. 'Não se sabe até que ponto uma planta transgênica vai competir com uma planta natural e causar danos', diz Tatiana Carvalho, do Greenpeace. Se esses organismos modificados tiverem alguma vantagem competitiva, eles suplantam a espécie anterior. 'A poluição genética tende a se expandir exponencialmente, mesmo que você tente controlá-la', explica a bióloga Maria Alice Garcia.

Além da ameaça a variedades nativas, outros fatores tiram o sono de ambientalistas e ecólogos, como efeitos não-intencionais sentidos pela fauna. A partir do momento que um transgênico é jogado na natureza, ele começa a interagir com todos os organismos do meio que se alimentam dessa planta, que variam de aves a bactérias que vivem no solo - essenciais para a ciclagem de nutrientes e a saúde do ecossistema.

Para evitar a erosão genética e a perda de biodiversidade, são necessários estudos de impacto ambiental que levem em conta as características do OGM e do ecossistema onde será inserido. 'O milho consegue jogar o pólen a muitos quilômetros, mas a soja se autopoliniza. Cada planta é uma planta, cada proteína é uma proteína', lembra Elíbio Rech, da Embrapa.

A legislação brasileira pede essa análise ao produtor, exigência que não foi respeitada no caso da soja plantada no Sul do país. 'Estamos em um país megadiverso, com uma condição de trópico e subtrópico, com uma variabilidade ambiental tremenda', lembra Garcia. 'Ninguém está realmente se preocupando em fazer análises de impacto e testes que avaliem o efeito do uso continuado sobre todas as comunidades.'

Um dos principais argumentos das empresas que desenvolvem alimentos transgênicos é a possibilidade de se reduzir a quantidade de agrotóxicos no meio ambiente. É o caso dos grãos Bt, com um gene da bactéria Bacillus thuringiensis. Por produzir uma toxina fatal ao inseto que come as folhas, o agricultor usa menos defensivos. Já as plantas Roundup Ready - soja, milho, algodão e canola - resistem ao herbicida glifosato por conterem gene de uma bactéria Agrobacterium, que vive no solo. Dessa forma, o produtor reduz as aplicações do químico durante o ciclo da cultura.

Superervas

Nos últimos anos, ervas daninhas resistentes ao glifosato têm surgido em Estados americanos produtores de soja transgênica. A tendência é que os agricultores tenham de usar outros herbicidas para vencer a resistência dessas variedades e, por conseqüência, perder sua vantagem competitiva. Da mesma forma, os evolucionistas alertam para o nascimento de insetos resistentes à toxina Bt. 'Há benefícios na engenharia genética', afirma a bióloga, 'mas o homem tem de desenvolver, conhecer e refinar essa tecnologia antes de liberá-la no meio ambiente.'

Borboletas entre transgênicos

O impacto dos organismos geneticamente modificados no meio ambiente é um dos temas mais controversos que rondam a engenharia genética, simplesmente porque não há estudos de longo prazo suficientes sobre o assunto. Em outubro, a questão ganhou novo peso com a publicação de uma série de artigos na revista 'Philosophical Transactions B', da academia de ciências do Reino Unido.

Segundo essas pesquisas, campos de canola e beterraba resistentes a herbicidas possuem 20% menos sementes de ervas daninhas no solo após a colheita. A redução afeta outros organismos, como insetos e pássaros, que se alimentam dessas ervas.

Os britânicos conhecem bem os efeitos maléficos e não-previstos da agricultura na biodiversidade. Com o advento da monocultura, plantas e insetos desapareceram dos campos do Reino Unido. Como conseqüência, metade das espécies nativas de aves corre perigo.

Em 1999, um artigo publicado na revista 'Nature' colocou fogo na discussão e tornou-se um capítulo clássico no debate sobre OGMs. O entomologista americano John Losey, da Universidade Cornell, demonstrava que o pólen de uma variedade de milho transgênico afetava a larva da borboleta monarca (Danau plexippus). Os dados deram munição para os críticos dos OGMs, para logo em seguida serem rebatidos pelos defensores. Eles acusaram Losey de conduzir os resultados ao reproduzir em laboratório o ambiente, em vez de estudar os efeitos em campo.

'Os impactos dessa transferência genética acabam ocorrendo em um efeito dominó, sobre o qual a gente não vai ter controle', acredita a bióloga Maria Alice Garcia.

PARTE 6