CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Veneno da jararaca tem mecanismo desvendado

veneno2Por Alex Sander Alcântara, 28/07/2010 - A Organização Mundial da Saúde incluiu recentemente o ofidismo (acidentes provocados por serpentes venenosas) como uma doença tropical negligenciada. No Brasil, as picadas de jararaca (Bothrops jararaca) respondem por cerca de 90% do total de acidentes com humanos envolvendo serpentes. O veneno da jararaca pode provocar lesões no local da picada, tais como hemorragia e necrose que podem levar, em casos mais graves, a amputações dos membros afetados. Uma das toxinas responsáveis pela ação hemorrágica do veneno da jararaca, a jararagina, foi isolada em 1992 ...

e é bastante estudada por pesquisadores no Brasil e de outros países. A jararagina faz parte da família de um grupo de proteínas (metaloproteinases), uma das principais responsáveis pelos efeitos locais da picada, como hemorragia, edema e inflamação.

Agora, uma pesquisa conduzida no Instituto Butantan demonstrou pela primeira vez como a toxina se liga aos vasos sanguíneos. O estudo, publicado na revista PLoS Neglected Tropical Diseases, descreve os mecanismos de ação da toxina e traz novas perspectivas para o desenvolvimento de medicamentos. De acordo com Cristiani Baldo, pós-doutoranda no Laboratório de Imunopatologia do Butantan e autora principal do artigo, o trabalho representa um importante avanço. “Conhecíamos a patologia e já se sabia que a proteína era hemorrágica, mas os mecanismos através dos quais ela induzia a hemorragia ainda não estavam completamente esclarecidos”, disse à Agência FAPESP . O trabalho publicado é resultado de sua tese de doutorado, intitulada “Mecanismos envolvidos na ação hemorrágica de metaloproteinases de venenos de serpentes”, com Bolsa da FAPESP e orientação de Ana M. Moura da Silva, do Laboratório de Imunopatologia do Butantan.

Atualmente, Cristiani desenvolve uma pesquisa de pós-doutoramento, também com Bolsa da FAPESP e supervisão de Ana Moura, intitulada “Efeitos da interação entre células endoteliais e jararagina em culturas tridimensionais ricas em colágeno”. Segundo Cristiani, o principal desafio era justamente entender o mecanismo. “A dificuldade estava em localizar a proteína no tecido afetado e saber como se comporta”, disse. Utilizando a técnica de microscopia confocal, a pesquisadora usou a pele de camundongos como modelo experimental. “Marcamos a toxina com uma substância fluorescente, que foi injetada na pele para determinar o caminho percorrido pela toxina”, explicou. Ao injetar na pele dos animais, observou-se que a toxina se concentrou nos pequenos vasos capilares. “Com 15 minutos, foi possível ver a hemorragia bastante evidente. Em períodos maiores, provavelmente haveria necrose”, explicou.

De acordo com o estudo publicado, a jararagina se fixa nas proximidades dos vasos, comprometendo sua integridade e induzindo o sangramento local, que se constitui em um dos principais sintomas do envenenamento. “Vimos que ela se localiza nas proximidades dos vasos sanguíneos, e esse acumulo é responsável pelo efeito hemorrágico tão evidente”, disse Cristiani. Uma das novidades do trabalho foi a utilização de uma metodologia inovadora para o experimento, que permitiu visualizar a toxina no local. “Passei dois anos tentando padronizar a metodologia, dos quais seis meses na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos”, disse.

Coagulação sanguínea

De acordo com o estudo publicado, a jararagina se fixa às proximidades dos vasos, ligando-se a componentes de matriz extracelular (responsáveis pela estrutura do vaso), comprometendo sua integridade e induzindo o sangramento local, que se constitui um dos principais sintomas do envenenamento. "Vimos que ela se localiza nas proximidades dos vasos sanguíneos, e esse acúmulo é responsável por esse efeito hemorrágico tão evidente", disse Cristiani. De acordo com a pesquisadora, o veneno da jararaca também induz alterações sistêmicas como coagulação sanguínea, alterações cardiovasculares e renais. Cristiane destaca que o soro antiofídico atualmente existentes, produzido em cavalos, é muito eficaz na neutralização desses efeitos.

“O grande problema são as lesões no local da picada caracterizadas principalmente por edema, inflamação e hemorragia, que não são neutralizadas pelo soro antiofídico. Diante disso, cerca de 10% das vítimas ficam com alguma sequela grave, tais como perda da função ou até mesmo amputação do local afetado”, disse.

“O soro antiofídico consegue neutralizar muito bem alguns efeitos do veneno, como alterações na coagulação do sangue, mas não consegue reverter os efeitos locais porque eles se estabelecem muito rapidamente”, explicou.

Segundo a pesquisadora, ao descobrir como a toxina age e induz a hemorragia, fica mais fácil propor algum tipo de aliado no tratamento das vítimas de envenenamento. “Outros grupos poderão utilizar algum inibidor dessa proteína como um tratamento aliado à soroterapia, mas esse não é o objetivo do nosso laboratório”, disse.

O artigo Mechanisms of Vascular Damage by Hemorrhagic Snake Venom Metalloproteinases: Tissue Distribution and In Situ Hydrolysis, de Cristiani Baldo e outros, pode ser lido em www.plosntds.org/article/info:doi/10.1371/journal.pntd.0000727.


Veneno da jararaca auxilia no tratamento da hipertensão

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03/09/2009 - Um peptídeo encontrado no veneno da jararaca poderá ser responsável por um novo medicamento no tratamento da hipertensão. É isso que afirma a farmacêutica e pesquisadora do Instituto Butantan, Claudiana Lameu, em sua tese doutorado defendida recentemente no Instituto de Química (IQ) da USP. Os peptídeos potenciadores de bradicinina (BPPs) atuariam no sistema nervoso central reduzindo a pressão arterial e a freqüência cardíaca.

Na verdade, os BPPs já são utilizados no tratamento de hipertensão há bastante tempo, por intermédio do medicamento Captopril. Contudo eles estão voltados para um outro foco, que é a inibição da enzima conversora de angiotensina (ECA), ou seja, a diminuição de certas substâncias hipertensoras no organismo.

Contudo, a atuação do peptídeo descoberta pela pesquisadora é totalmente diferente. Os BPPs atuariam no aumento da sensibilidade do barorreflexo. O exemplo que Claudiana utiliza para explicar os barorreflexo é bem simples: “Quando agachamos e levantamos rápido, a nossa pressão poderia diminuir bruscamente e nos deixar com tontura. Porém, nós temos um controle que não deixa isso acontecer. É o controle dos barorreceptores atuando.”

Os barorreceptores mandam informações para o sistema nervoso central (SNC) diminuindo ou aumentando a pressão arterial e a freqüência cardíaca quando necessário. A pesquisadora explica que os atuais medicamentos que atuam na diminuição da pressão arterial têm como contrapartida o aumento da freqüência cardíaca, o que não aconteceria num fármaco originário deste peptídeo encontrado no veneno da jararaca, que diminui, ao mesmo tempo, pressão e freqüência cardíaca.

“Não há no mercado nenhum medicamento que controle esse barorreflexo e os hipertensos têm a sensibilidade desse mecanismo diminuída”, destaca a pesquisadora. Ela comenta que ainda não se sabe a origem fisiológica da hipertensão, mas se sabe vários sinais que identificam um hipertenso até mesmo antes de a pessoa contrair a doença. Um deles é a sensibilidade alterada do barorreflexo.

Efeito terapêutico

A pesquisa feita pelo grupo que Claudiana participa utilizou ratos hipertensos os quais foi inserida uma bomba de infusão que injetava continuamente uma determinada dose do peptídeo no animal por um determinado período de tempo definido. O período mais prolongado de exposição à substância foi de 28 dias.

Quanto ao medicamento a ser produzido, Claudiana entende que ele deve ser utilizado para uso crônico, mesmo porque mais importante que o efeito instantâneo dos BPPs é o efeito sentido depois de algumas horas. “Nós já temos resultados de que, com bomba de infusão, a substância consegue manter a pressão do hipertenso em níveis normais, muito próximo dos animais normotensos (sem problemas de pressão alta ou baixa)”, destaca.

Outra descoberta em relação aos normotensos é que eles não sofrem nenhum efeito quando são expostos ao peptídeo. Uma vez que ele não tem problemas nos barorreceptores, o efeito exercido pelo medicamento seria nulo.

Segundo a pesquisadora não foi encontrado nenhum efeito colateral até o momento. Ela esclarece que a molécula responsável pelo tratamento não está presente apenas no veneno da serpente, mas também no cérebro e no baço. “É algo que é bom pra serpente. Ela não teria essa substância no sistema nervoso se não fosse para algum mecanismo fisiológico importante”, completa Claudiana.


Veneno da jararaca poderá ajudar no tratamento de Parkinson e trombose

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26/08/2011 - A picada de uma serpente pode ser fatal. No caso da jararaca, uma das cobras mais venenosas da fauna brasileira, as toxinas podem causar paralisia, hemorragia e falência dos rins. Porém, dois grupos de pesquisa brasileiros — um da Universidade de São Paulo (USP) e outro da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) — estão ajudando a amenizar a má fama do bicho. Eles descobriram que substâncias presentes no veneno da jararaca podem ajudar no tratamento de doenças, como o Parkinson e a trombose. As descobertas foram apresentadas na FeSBE 2011 (reunião anual da Federação de Sociedades de Biologia Experimental), que acontece no Rio de Janeiro entre os dias 24 e 27 de agosto.

O primeiro trabalho, chefiado pelo biólogo alemão Henning Ulrich, da Universidade de São Paulo, mostra que uma molécula presente no veneno da jararaca, o BPP, indiretamente, pode ajudar a estimular a formação de células nervosas no cérebro. Isso quer dizer que doenças degenerativas, como o Parkinson, têm chances de serem tratadas com a substância. O outro estudo, coordenado pela professora Lina Zingali, da UFRJ, descobriu que duas substâncias isoladas do veneno da jararaca podem ajudar no tratamento de doenças ligadas à coagulação do sangue, como a trombose.

Doenças degenerativas — Em 1949, o cientista brasileiro Rocha e Silva isolou uma molécula de altíssima concentração no veneno da jararaca, o BPP, e descobriu que ela ajudava a reduzir a pressão arterial. A descoberta brasileira serviu de base para o desenvolvimento do medicamento Captopril, que combate a hipertensão. O BPP ativa uma substância do sangue chamada bradicinina. Essa molécula está associada com a redução da pressão arterial e processos inflamatórios no organismo. É uma substância presente em todos os mamíferos.

O estudo das funções da bradicinina sobre a formação de neurônios começou em 2001, quando Ulrich foi contratado como docente da USP. A partir daí, Ulrich, junto com a cientista Telma Schwindt, e os doutorandos Cleber Trujillo e Henrique Martins perceberam que a bradicinina era capaz de ativar células-tronco presentes no cérebro. "Essas células amadurecem e formam novas ligações nervosas quando há algum dano neural", disse o biólogo alemão, em bom português.

Isso quer dizer que a degeneração de células nervosas causada por doenças como o Parkinson e por derrames, explica Ulrich, pode ser combatida com a molécula do veneno da jararaca. Contudo, os cientistas ainda não realizaram estudos nesse sentido. A equipe de Ulrich percebeu também que, em ratos que sofreram um derrame, a bradicinina ajuda a impedir a morte das células saudáveis.

O tratamento em humanos, contudo, ainda está longe. Ulrich explicou que a pesquisa precisa migrar dos modelos animais para os humanos, e um tratamento pode demorar até 10 anos para virar realidade.

Descoagulante — Outra pesquisa, coordenada pela professora Lina Zingali do Instituto de Bioquímica Médica da UFRJ, isolou duas moléculas do veneno da jararaca, chamadas jarastatina e jararacina. Essas substâncias fazem parte de um grupo de moléculas chamado desintegrina, capazes de prevenir a coagulação do sangue. Os pesquisadores queriam encontrar químicos que não causassem tantos efeitos colaterais quanto os atuais remédios que combatem as doenças ligadas à coagulação sanguínea, como a trombose.

As duas moléculas isoladas pelo grupo da UFRJ foram capazes de inibir o acúmulo de plaquetas em amostras de sangue humano. Quanto maior a dose de jarastatina e jararacina, maior a descoagulação sanguínea. Das duas, a jararacina é a mais potente.

A utilização das moléculas do veneno da jararaca em remédios para seres humanos ainda pode demorar. Os resultados da pesquisa mostram que, no laboratório, as substâncias podem ajudar pessoas com trombose, mas é preciso realizar testes em animais. Em seguida, seriam feitos os testes com humanos.

A equipe precisa saber qual dose pode ser tolerada pelo organismo das pessoas e se haverá efeitos colaterais. Os resultados foram publicados no periódico Archives of Biochermistry and Biophysics.


Descobertas em veneno de jararaca podem contribuir para criação de remédios


04/12/2012 - Trinta novas moléculas, algumas com potencial ação farmacológica, foram descobertas no Instituto Butantan, em São Paulo, durante uma pesquisa que mapeou o conjunto de peptídeos existente no veneno de três espécies de serpentes do gênero Bothrops, entre elas a jararaca, informa a Agência Fapesp. "O objetivo do trabalho era descrever a complexidade do peptidoma, ou conjunto de peptídeos, presente no veneno das espécies B. jararaca, B. cotiara e B. fonsecai", explica Solange Maria de Toledo Serrano, coordenadora da pesquisa. Peptídeo é qualquer substância com dois ou mais aminoácidos conjugados, exercendo funções específicas no organismo.

Foram sequenciados 44 peptídeos, dos quais 30 ainda eram desconhecidos. Entre as novas moléculas, pelo menos quatro já testadas apresentaram atividade de potenciação da bradicinina e inibição da atividade da enzima conversora de angiotensina, substâncias envolvidas no controle da pressão arterial.

As serpentes do gênero Bothrops são responsáveis por cerca de 90% dos acidentes ofídicos que ocorrem no país, revela o estudo. A grande maioria dos casos envolve a jararaca, comum no país inteiro. Já a B. cotiara está presente apenas nas regiões de mata araucária e a B. fonsecai, na Mata Atlântica.

O primeiro peptídeo potenciador de bradicinina isolado no veneno da jararaca, ainda nos anos 1960, deu origem a toda uma classe de medicamentos anti-hipertensivos à qual pertence, por exemplo, o Captopril. Os resultados do estudo, considerado o mais profundo já realizado sobre peptidomas de venenos de serpentes, foram divulgados em artigo publicado na edição de novembro da revista Molecular & Cellular Proteomics.


A Jararaca


Nome Científico: Bothropoides jararaca

Família: Viperidae

Ordem: Squamata

Distribuição: No Brasil, nos estados da Bahia, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. Também ocorre em outros países da América do Sul e Central.

Habitat: Florestas e cerrado.

Alimentação: Essencialmente roedores. Quando filhote, como a maioria dos répteis de seu gênero, utiliza a cauda para atrair pequenas rãs, sapos e lagartos.

Reprodução: Essa cobra dá a luz aos filhotes, ao invés de colocar ovos. Por isso é classificada de vivípara. Em média, são de 6 a 16 indivíduos por vez, mas já houve registro de até 34 filhotes. As cobrinhas, em geral, nascem no início da estação das chuvas.

De hábitos noturnos, a jararaca é a cobra mais conhecida do gênero Bothrops. Apesar de perigosa, sempre foge ao ser avistada. Aliás, coisa não muito fácil de acontecer é vê-la, graças à excelente camuflagem de sua pele (mesmo para olhos experientes).

Chega a medir 120 centímetros. Existem mais de 30 variedades deste gênero no Brasil.
Uma coisa é certa: as jararacas são responsáveis por 88% dos acidentes com cobras no País. Diante disso, todo cuidado é pouco ao andar pela mata e, de preferência, com botas. De todo modo, dizem, é mais fácil ser picado por uma jararaca em um sítio mal cuidado ou em um lugar cheio de ratos do que na floresta.

A jararaca é conhecida também como caiçara, jaraca, jararacão e jararaca-dormideira. Atualmente ela é encontrada até em áreas degradadas.

Saiba mais: Instituto Butantan - http://www.butantan.gov.br/

Fonte: http://agencia.fapesp.br/
http://wwo.uai.com.br
http://veja.abril.com.br/
http://www.terradagente.com.br