O Absinto: Entre Misticismo, Arte e Loucura – Uma Jornada pela Bebida que Encantou os Maiores Gênios da História. “A fada verde dança na taça. Sussurra segredos aos ouvidos do poeta e faz o pincel do pintor voar.” Imagine-se em um café escuro de Paris, no final do século XIX. O ar cheira a tabaco, tinta e algo mais... algo misterioso, quase mágico. Nas mesas lotadas, artistas, escritores e boêmios despejam em seus copos uma bebida esmeralda que parece ter vida própria.
Essa é a história do absinto — não apenas uma bebida, mas um verdadeiro símbolo de uma era , uma lenda líquida que atravessou séculos, proibições e até mesmo as fronteiras da sanidade.
Um Breve Encontro com a Fada Verde
Se você nunca provou absinto, talvez tenha ao menos ouvido falar dele como “aquela bebida alucinógena” ou “o licor dos loucos”. Mas a realidade é muito mais rica — e fascinante — do que os mitos sugerem. Criado por volta de 1792 pelo médico francês Pierre Ordinaire , que morava em Couvet, na Suíça, o absinto começou sua trajetória como remédio caseiro . Sim, leu certo: uma mistura de ervas usada para fins terapêuticos virou a paixão mais controversa das boêmias parisienses. A receita original incluía principalmente Artemisia absinthium (mau-cheiro-de-santa-maria), funcho e anis estrelado — ingredientes conhecidos por suas propriedades digestivas e estimulantes.
Mas foi na França, especialmente em Paris, que o absinto se tornou lendário . Chegou às ruas, cafés e ateliês como um símbolo de rebeldia, inspiração e decadência. Os artistas o adoravam. Dizia-se que ele abria portas para a criatividade. Outros juravam que revelava verdades ocultas. Alguns... bem, alguns só queriam esquecer.
Por Que Tão Verde? E Por Que Tão Forte?
O absinto tradicional tem cor verde-esmeralda , graças à maceração de ervas como hortelã, melissa e outras plantas aromáticas durante o processo de produção. Esse processo também confere à bebida seu sabor característico: anisado, amargo e complexo , como um encontro entre menta fresca e uma floresta úmida no outono. E quanto ao teor alcoólico? Prepare-se: o absinto pode conter entre 45% e 74% de álcool por volume (ABV) . Isso mesmo — estamos falando de algo que pode deixar você de joelhos depois de dois goles… se você for tolo o bastante de beber puro. O correto? Diluir com água gelada, gota a gota, usando um açúcar dissolvendo-se lentamente sobre uma colher entalhada.
Esse ritual — chamado de “ritual do absinto” — é parte do encanto. A bebida turva-se ao contato com a água fria, formando aquela emulsão leitosa e opalescente que parece pulsar com energia. É nesse momento que a “fada verde” desperta.
O Poder Alucinógeno? Verdade ou Invenção?
Uma das maiores lendas em torno do absinto é a de que ele causaria efeitos alucinógenos . A culpa disso tudo vai para o tujona , composto químico encontrado na Artemísia absinthium. Durante anos, acreditava-se que essa substância pudesse provocar loucura, convulsões e até ataques epilépticos. No entanto, estudos modernos mostraram que a concentração de tujona nos absintos tradicionais era mínima , longe de ser capaz de induzir alucinações. O que explicaria os relatos de transtornos mentais? Talvez o alto teor alcoólico, somado ao consumo excessivo, às condições precárias da época e à falta de regulamentação. Mesmo assim, a ideia de que o absinto abre portas para o sobrenatural persiste. Artistas diziam que ele despertava musas adormecidas , ampliava sentidos e libertava a imaginação. Até hoje, muitos juram que há algo quase místico no ato de preparar e saborear uma dose bem feita.
Quem Bebia a Fada Verde? Uma Galeria de Gênios (e Loucos)
O rol de adeptos do absinto é digno de museu. Literalmente:
Charles Baudelaire : Poeta maldito, mergulhou fundo nas brumas verdes.
Vincent van Gogh : Dizem que o absinto alimentava suas crises e cores vibrantes.
Oscar Wilde : Supostamente disse que “após a primeira taça, vê-se as coisas como gostaria que fossem; após a segunda, como nunca foram.”
Ernest Hemingway : Em "Morte ao Amanhã", descreve como preparava absinto com suco de limão, sem água.
Pablo Picasso : Inspirado, desenhou cenas oníricas embalado pela bebida.
Fernando Pessoa : Também tinha fraqueza pela fada verde.
Essa lista poderia continuar por páginas. São nomes que moldaram séculos, revolucionaram arte, literatura e pensamento. E todos tinham um ponto em comum: precisavam da fada verde .
A Queda e o Renascimento da Bebida Proibida
Por volta de 1915, o absinto foi banido em vários países, incluindo a França, Suíça, Estados Unidos e outros. A combinação de preocupações com a saúde pública , campanhas anti-absinto lideradas por grupos religiosos e movimentos temperantes, e um caso trágico envolvendo um agricultor suíço que matou sua família após consumir grandes quantidades da bebida, selou o destino da fada verde. MPor décadas, ela viveu nas sombras, lembrada apenas em poemas, cartas e memórias. Mas como todo grande mito, o absinto voltou — e com força total.
Nos anos 1980 e 1990, novas pesquisas científicas começaram a dissipar os fantasmas do passado. Com isso, várias regiões da Europa e dos EUA legalizaram novamente o absinto , desde que seguisse padrões rigorosos de produção, especialmente no que diz respeito à quantidade de tujona. Hoje, há dezenas de marcas artesanais , cada uma com sua assinatura única. Do clássico Pontarlier francês ao absinto tcheco moderno, o mercado explodiu. Existem variações transparentes (chamadas "la bleue" ), versões com menos anis, outras com toques frutados ou florais. Cada gole é uma descoberta.
Como Beber Absinto: Ritual ou Revolução?
Beber absinto não é simplesmente tomar uma bebida. É participar de um ritual . É como acender um incenso antes de meditar, ou apagar todas as luzes antes de ler um conto de terror.
Passo a passo para preparar o absinto:
Coloque 30ml a 60ml de absinto num copo especial (geralmente com marca d'água).
Posicione uma colher de absinto (com furos) sobre o copo.
Coloque um cubo de açúcar na colher .
Pingue água gelada lentamente sobre o açúcar , permitindo que ele derreta e caia no copo.
Observe a bebida turvar-se , liberando óleos essenciais e aromas.
Sirva e saboreie devagar.
A proporção ideal costuma ser 1 parte de absinto para 3 ou 5 partes de água . Mas isso depende do gosto pessoal. Alguns preferem mais forte, outros mais suave.
Curiosidades que Você Precisa Saber
O termo “absinto” vem do latim absinthium , que por sua vez vem do grego apsinthion , referindo-se à erva Artemísia.
No início do século XX, o absinto chegou a ser consumido por soldados franceses no norte da África como forma de prevenir doenças tropicais.
O absinto também foi usado por Aleister Crowley , o famoso ocultista britânico, em rituais mágicos.
Em 2007, a União Europeia instituiu regras claras para a produção legal de absinto, limitando a quantidade de tujona a 35 mg/l .
Existem absintos coloridos artificialmente (como o roxo ou azul), mas os verdadeiros puristas consideram isso um sacrilégio.
Na Romênia, existe uma bebida similar chamada horincă , e na Grécia, o ouzo compartilha algumas características, mas não é exatamente absinto.
Absinto Hoje: Moda ou Tradição? Você já viu uma garrafa de absinto numa loja bacana, ou em algum bar especializado em coquetéis vintage. E talvez tenha se perguntado: “será que ainda vale a pena?” A resposta é sim. E não apenas por nostalgia.
O renascimento do absinto está ligado ao boom do craft drinking , à busca por experiências sensoriais autênticas e ao desejo de redescobrir tradições perdidas. Além disso, há um certo charme em beber algo que já foi proibido, perigoso e misterioso. Claro, hoje ele é mais seguro, mais equilibrado e mais acessível. Mas ainda carrega aquele cheiro de rebelião, poesia e liberdade .
Conclusão: A Fada Verde Nunca Morreu
O absinto é muito mais do que uma bebida. É uma janela para outra época , um cálice de inspiração, uma centelha de insanidade controlada. É a voz rouca de Verlaine recitando versos, é a mão trêmula de Van Gogh traçando céus noturnos, é a caneta de Pessoa rabiscando mágoas eternas. Hoje, ele está de volta, não como vilão, nem como herói, mas como personagem central de uma história que continua sendo escrita . Seja você o próximo autor. Sirva-se devagar, prepare-se com cuidado, e deixe a fada verde sussurrar em seu ouvido.
Quem sabe o que ela tem a dizer...