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Engenharia de Tecidos Vasculares: Como a Pele de Tilápia Pode Transformar a Cirurgia Vascular

tilapiapele22022 - Unindo o colágeno proveniente de peixe a um polímero artificial, o composto apresenta-se como uma alternativa eficaz e economicamente vantajosa no tratamento de afecções vasculares. As enfermidades arteriais vasculares representam uma das principais causas de óbito global, contribuindo para o aumento de procedimentos cirúrgicos vasculares, destinados a assegurar o adequado fluxo sanguíneo. Os enxertos artificiais figuram como uma escolha viável para pacientes que necessitam reconstruir ou substituir esses vasos sanguíneos prejudicados. Cientes desse cenário e em busca de propostas mais eficazes, uma tese apresentada no âmbito do Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas: Fisiologia da UFRGS desenvolveu um biomaterial que emprega colágeno extraído da derme da tilápia para o tratamento de condições vasculares.

Conduzido pela pesquisadora Bruna Borstmann Jardim Leal, sob a orientação da professora Patricia Pranke, o estudo tem como propósito contribuir para o avanço futuro de enxertos vasculares sintéticos de menor dimensão. Os materiais atualmente disponíveis apresentam uma elevada taxa de insucesso em vasos sanguíneos de reduzido diâmetro, devido à formação de trombos (coágulos que obstaculizam a circulação sanguínea).

A trajetória de Bruna no desenvolvimento de biomateriais vasculares teve início durante sua pesquisa de conclusão de curso em Biomedicina na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), ao ingressar no laboratório liderado por Patricia. Durante seu mestrado, Bruna e Patricia iniciaram conjuntamente o estudo sobre a aplicação da derme de tilápia, utilizando o colágeno extraído pelo grupo de pesquisadores colaboradores do Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos da Universidade Federal do Ceará (UFC).

O estudo foi conduzido por meio da engenharia de tecidos, um campo da medicina regenerativa que combina princípios da engenharia e biologia, proporcionando opções para o desenvolvimento de tecidos com o objetivo de substituir aqueles sujeitos a elevada rejeição imunológica. Desta maneira, a engenharia de tecidos vasculares busca soluções para regenerar tecidos possivelmente danificados ou substituí-los por materiais análogos à estrutura dos vasos sanguíneos.

Segundo Bruna, o objetivo primordial do trabalho consistiu em criar um enxerto vascular sintético para utilização em vasos sanguíneos de pequeno porte, ampliando as alternativas já existentes no mercado. "Essa é a principal abordagem do meu trabalho: buscamos desenvolver um enxerto vascular sintético aplicável a vasos com diâmetro inferior a 6 mm", explica.

No desenvolvimento de biomateriais, é viável empregar tanto polímeros de origem natural quanto sintética. A sinergia entre essas categorias possibilita a criação de um material que apresenta propriedades biológicas e mecânicas adequadas para servir como enxerto vascular. Os polímeros naturais, exemplificados pelo colágeno, exibem características análogas às proteínas presentes na matriz extracelular natural. Tal similaridade facilita a conexão das células com o biomaterial utilizado. Contudo, é importante destacar que esses polímeros possuem propriedades mecânicas menos propícias. Bruna enfatiza a necessidade de uma função mecânica robusta para a fabricação de vasos sanguíneos, considerando a elevada pressão do fluxo sanguíneo.

Por outro lado, os polímeros sintéticos, como a poli(caprolactona) (PCL) - material empregado no desenvolvimento do biomaterial por Bruna -, exibem uma função mecânica eficaz e são mais estáveis quando comparados aos polímeros naturais. Nesse contexto, a fusão dessas duas variedades de polímeros possibilita a criação de biomateriais mais eficientes. Bruna destaca a complementaridade entre ambos os tipos, ilustrando isso no seu trabalho ao associar a PCL ao colágeno da pele de tilápia na parte referente aos polímeros naturais.

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A partir da técnica de eletrofiação (produção de fibras com diâmetros em escala nanométrica), a pesquisa apresentou distintos tipos de biomateriais: um composto unicamente por polímero sintético de PCL e dois contendo PCL associada (ou seja, mesclada em uma mesma solução) ao colágeno proveniente da pele de tilápia, em proporções de 50:50 e 25:75.

Adicionalmente, a investigadora avaliou um biomaterial de PCL funcionalizado com colágeno, ou seja, inicialmente confeccionado com PCL e, posteriormente, teve o colágeno acrescentado. A pesquisadora relata que, ao adicionar o colágeno de maneira funcionalizada a esse biomaterial exclusivamente de PCL, observou-se um incremento nas propriedades biológicas, facilitando a aderência e proliferação das células sobre o biomaterial.

A análise indicou que os biomateriais originados da combinação de polímeros sintéticos e naturais exibem grupos funcionais da PCL e do colágeno, tornando-os apropriados para aplicação na engenharia de tecidos vasculares, devido ao diâmetro semelhante ao das fibras da matriz extracelular natural.

Robusta e rica em colágeno, a pele de tilápia tem sido objeto de estudo na engenharia de tecidos como um material biológico alternativo e econômico. Similar à pele humana, a pele de tilápia possui resistência à tração e seu colágeno estimula o crescimento de fibroblastos, células envolvidas na cicatrização, promovendo a angiogênese, processo fundamental na formação de vasos sanguíneos a partir de vasos preexistentes, características cruciais para enxertos vasculares.

Bruna destaca que a pele de tilápia, geralmente descartada, pode ser utilizada como matéria-prima valiosa, evitando o desperdício e aproveitando o colágeno. Ela salienta que, embora a pesquisa represente um marco inicial, são necessários mais testes para que possa efetivamente alcançar o mercado. O estudo realizado até o momento concentrou-se exclusivamente em testes celulares, sendo o próximo passo avaliações em animais e, posteriormente, em seres humanos.

REFERENCIAS:     SAENSE

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