RELIGIÃO, CULTOS E OUTROS

O Concílio de Niceia - Parte 2

niceia2Historiadores do Concílio de Niceia - Uma boa fonte para o estudo deste período histórico é-nos apresentada hoje sob a forma da obra de Edward Gibbon, um historiador representativo do iluminismo inglês do século XVIII, ainda hoje lida e traduzida para várias línguas: A história do declínio e queda do império romano. Há diversas obras a respeito do Concílio ...

de Niceia, mas de fato os historiadores que gozam de mais credibilidade e são a fonte desse período histórico para os demais autores são os próprios contemporâneos do Concílio de Niceia: Eusébio, Sócrates de Constantinopla, Sozomenes, Teodoreto e Rufino, junto com algumas informações conservadas por Atanásio e uma história do Concílio de Nicéia escrita em grego no século V por Gelásio de Cícico.

O carácter, a sociedade, e os problemas


A cristandade do século II não concordava sobre a data de celebração da Páscoa da ressurreição. As igrejas da Ásia Menor, entre elas a importante igreja de Éfeso, celebravam-na, juntamente com os judeus, no 14º dia da primeira lua da primavera (o 14º Nisan, segundo o calendário judaico), sem levar em consideração o dia da semana. Já as igrejas de Roma e de Alexandria, juntamente com muitas outras igrejas tanto ocidentais quanto orientais, celebravam-na no domingo subsequente ao 14º Nisan. Com vistas à fixação de uma data comum, em 154 ou 155, o bispo Policarpo de Esmirna, entrou em contato com o papa Aniceto, mas nenhuma unificação foi conseguida e o assunto permaneceu em aberto.

Foi no concílio de Niceia que se decidiu então resolver a questão estabelecendo que a Páscoa dos cristãos seria sempre celebrada no domingo seguinte ao plenilúnio após o equinócio da primavera. Apesar de todo esse esforço, as diferenças de calendário entre Ocidente e Oriente fizeram com que esta vontade de festejar a Páscoa em toda a parte no mesmo dia continuasse sendo um belo sonho, e isso até os dias de hoje.

Além desse problema menor, outra questão mais séria incomodava a cristandade católica: como conciliar a divindade de Jesus Cristo com o dogma de fé num único Deus?

Na época a inteligência dos cristãos ainda estava à procura de uma fórmula satisfatória para a questão, embora já houvesse a consciência da imutabilidade de Deus e da existência divina do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Nesse quadro, um presbítero de nome Ário passa a defender em Alexandria a ideia de que Jesus é uma "criatura do Pai", não sendo, portanto, eterno. Em suas pregações, Ário por várias vezes insistia em afirmar em tom provocativo que "houve um tempo em que o Filho não existia". Dizia que Cristo teria sido apenas um instrumento de Deus mas sem natureza divina. A esse ensinamento de Ário aderiram outros bispos e presbíteros. Sobretudo, o bispo Eusébio de Cesareia, conhecido escritor da igreja, que se colocou do lado de Ário.

Por outro lado, a doutrina de Ário, ou arianismo, foi prontamente repudiada pelo restante dos cristãos, que viam nela uma negação do dogma da Encarnação. O repúdio mais radical talvez Ário tenha encontrado no bispo Alexandre de Alexandria e no diácono Atanásio, que defendiam enfaticamente a divindade de Cristo. Um sínodo foi convocado e a doutrina do Ário foi excluída da igreja em 318. Mas o número de seus adeptos já era tão grande que a doutrina não pode ser mais silenciada. A situação se agravava cada vez mais e, desejoso de resolver de vez a questão, o imperador Constantino, que recentemente, no ano de 324 d.C., havia se tornado o imperador também do oriente convoca um concílio ecumênico.

Dado este importante, pois apesar de Constantino agora ser o imperador também do oriente mostra a independência que os Bispos orientais (a maioria no Concílio) tinham do seu recente imperador.


Os procedimentos


O concílio foi aberto formalmente a 20 de maio, na estrutura central do palácio imperial, ocupando-se com discussões preparatórias na questão ariana, em que Arius, com alguns seguidores, em especial Eusébio de Nicomédia, Teógnis de Nice, e Maris de Chalcedon, parecem ter sido os principais líderes; as sessões regulares, no entanto, começaram somente com a chegada do imperador. O imperador abriu a sessão na condição de presidente de honra e, depois, assistiu às sessões posteriores, mas a direção das discussões teológicas ficou com as autoridades eclesiásticas do Concílio.

Nem Eusébio de Cesárea, Sócrates, Sozomenes, Rufino e Gelásio de Cícico, proporcionam detalhes das discussões teológicas. Rufino nos diz tão somente que se celebraram sessões diárias, as opiniões de Ario eram escutadas e discutidas com seriedade, apesar que a maioria se declarava energicamente contra suas doutrinas.

No início os arianos e os ortodoxos mostraram-se incondescendentes entre si. Os arianos confiaram a representação de seus interesses a Eusébio de Cesareia, cujo nível e a eloquência fez uma boa impressão perante o imperador. A sua leitura da confissão dos arianos provocou uma tempestade de raiva entre os oponentes.

No seu interesse, assim como para sua própria causa, Eusébio, depois de ter cessado de representar os arianos, apareceu como um mediador. Apresentou o símbolo (credo) baptismal de Cesareia que acabou por se tornar a base do Credo niceno.

A votação final, quanto ao reconhecimento da divindade de Cristo, foi um total de 300 votos a favor contra 2 desfavoráveis. A doutrina de Ario foi anatematizada e os 2 Bispos que votaram contra e mantiveram sua posição contrariando a posição do Concílio foram exilados pelo imperador.


A profissão de Fé e os cânones do Concílio de Niceia


O Concílio de Nicéia estabeleceu 20 cânones, os quais darão seqüência ao Credo. Um breve resumo de seu conteúdo:

Cânon I - Eunucos podem ser recebidos entre os clérigos, mas não serão aceitos aqueles que se castram.

Cânon II - Aqueles que provieram do paganismo não poderão ser imediatamente promovidos ao Presbiterato, pois não é de conveniência um neófito sem uma provação de algum tempo. Mas se depois da ordenação constatou-se que ele anteriormente pecara, que seja afastado do Clero.

Cânon III - Nenhum deles deverá ter uma mulher em sua causa, exceto sua mãe, irmã e pessoas totalmente acima de suspeita.

Cânon IV - Um bispo deve ser escolhido por todos os bispos da província ou, no mínimo, por três, apresentando os restantes seu assentimento por carta; mas a escolha deve ser confirmada pelo metropolita.

Cânon V - Quem foi excomungado por algum bispo não deve ser restituído por outro, a não ser que a excomunhão tenha resultado de pusilanimidade ou contenda ou alguma outra razão semelhante. Para que esse assunto seja resolvido convenientemente, deverá haver dois sínodos por ano em cada província - um na Quaresma e o outro no outono.

Cânon VI - O bispo de Alexandria terá jurisdição sobre o Egito, Líbia e Pentápolis; assim como o bispo Romano sobre o que está sujeito a Roma. Assim, também, o bispo de Antioquia e os outros, sobre o que está sob sua jurisdição. Se alguém foi feito bispo contrariamente ao juízo do Metropolita, não se torne bispo. No caso de ser de acordo com os cânones e com o sufrágio da maioria, se três são contra, a objeção deles não terá força.

Cânon VII - O bispo de Aélia seja honorificado, preservando-se intactos os direitos da Metrópole.

Cânon VIII - Se aqueles denominados Cátaros voltarem, que eles primeiro façam uma profissão de que estão dispostos a entrar em comunhão com aqueles que se casaram uma segunda vez, e a dar perdão aos que apostataram. E nessas condições, aquele que estava ordenado continuará no mesmo ministério, assim como o bispo continuará bispo. Àquele que foi Bispo entre os Cátaros permita-se que, no entanto, seja um corepíscopo ou goze a honra de um presbítero ou bispo. Não deverá haver dois bispos numa única igreja.

Cânon IX - Quem quer que for ordenado sem exame deverá ser deposto, se depois vier a ser descoberto que foi culpado de crime.

Cânon X - Alguém que apostatou deve ser deposto, tivessem ou não consciência de sua culpa os que o ordenaram.

Cânon XI - Os que caíram sem necessidade, ainda que, portanto, indignos de indulgência, no entanto lhes será concedida alguma indulgência, e eles deverão ser "genuflectores" por doze anos.

Cânon XII - Aqueles que sofreram violência e indicaram que resistiram, mas depois caíram na maldade e voltaram ao exército, deverão ser excomungados por dez anos. Mas, de qualquer modo, a maneira de fazerem penitência deve ser examinada. O bispo poderá tratar mais brandamente alguém que está fazendo penitência e se mostrou zeloso em seu cumprimento do que quem foi frio e indiferente.

Cânon XIII - Os moribundos devem receber a comunhão. Mas se alguém se recupera, deve ser posto no número daqueles que participam das preces, e somente com eles.

Cânon XIV - Se alguns dos catecúmenos caíram em apostasia, deverão ser somente "ouvintes" por três anos; depois poderão orar com os catecúmenos.

Cânon XV - Bispos, presbíteros e diáconos não se transferirão de cidade para cidade, mas deverão ser reconduzidos, se tentarem fazê-lo, para a igreja para a qual foram ordenados.

Cânon XVI - Os presbíteros ou diáconos que desertarem de sua própria igreja não devem ser admitidos em outra, mas devem ser devolvidos à sua própria diocese. A ordenação deve ser cancelada se algum bispo ordenar alguém que pertence a outra igreja, sem consentimento do bispo dessa igreja.

Cânon XVII - Se alguém do clero praticar usura ou receber 150% do que emprestou deve ser excluído e deposto.

Cânon XVIII - Os diáconos devem permanecer dentro de suas atribuições. Não devem administrar a Eucaristia a presbíteros, nem tomá-la antes deles, nem sentar-se entre os presbíteros. Pois que tudo isso é contrário ao cânon e à correta ordem.

Cânon XIX - Os Paulianistas devem ser rebatizados. Se alguns são clérigos e isentos de culpa devem ser ordenados. Se não parecem isentos de culpa, devem ser depostos. As diaconisas que se desviaram devem ser colocadas entre os leigos, uma vez que não compartilham da ordenação.

Cânon XX - Nos dias do Senhor e de Pentecostes, todos devem rezar de pé e não ajoelhados.


Nas atas do Concílio de Niceia, assinadas por todos os bispos participantes, com exceção dos dois seguidores de Ario, constou o texto da seguinte profissão de Fé:

"Cremos em um só Deus, Pai todo poderoso, Criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis; E em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho de Deus, gerado do Pai, unigênito, isto é, da substância do Pai, Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial do Pai, por quem todas as coisas foram feitas no céu e na terra, o qual por causa de nós homens e por causa de nossa salvação desceu, se encarnou e se fez homem, padeceu e ressuscitou ao terceiro dia, subiu aos céus e virá para julgar os vivos e os mortos; E no Espírito Santo. Mas quantos àqueles que dizem: 'existiu quando não era' e 'antes que nascesse não era' e 'foi feito do nada', ou àqueles que afirmam que o Filho de Deus é uma hipóstase ou substância diferente, ou foi criado, ou é sujeito à alteração e mudança, a estes a Igreja Católica anatematiza".


O Concílio


Segundo Helena Blavatsky uma névoa de mistério envolve este concílio, o qual “… pode muito bem ser chamado de misterioso. Havia mistério, em primeiro lugar, no número místico dos seus 318 5 bispos, a que Barnabé deu muita importância; além disso não há concordância entre os escritores antigos quanto à época e ao local de realização dessa reunião, nem mesmo sobre quem seria o bispo que a presidiu” 6. Não obstante, os frutos da realização deste concílio marcaram de forma indelével o curso da nossa civilização.

Segundo a história oficial da Igreja Católica, o concilio terá sido presidido pelo próprio Imperador Constantino, e nele terá estado presente Eusébio de Cesareia, um dos maiores apoiantes da Ortodoxia, que mais tarde reescreveu a história da Igreja, segundo a perspectiva do Cristianismo Imperial de Constantino.

Deve-se a este concílio duas ferramentas chave da teologia da igreja Católica:

A decisão de quais, entre os muitos Evangelhos existentes, eram inspirados pelo Divino, ou seja, a selecção dos Evangelhos oficiais (e a subsequente erradicação de todos os escritos considerados apócrifos);

A formulação Oficial da Doutrina da Trindade, em que a Igreja rejeita o principio “Ariano” (de Arius) e afirma que Jesus é da mesma substância (ou seja, é a mesma entidade) que Deus.

Consequentemente, o Credo de Niceia foi redigido e modificado (nele se inserindo várias redundâncias) de forma a identificar o Pai com o Filho. Quem discordou, foi pura e simplesmente perseguido pelo imperador.

Ainda durante os vários séculos posteriores, os concílios defenderam as visões mais antagónicas e contraditórias sobre a Doutrina da Trindade, visando reforçar cada vez mais a ideia da identidade de Jesus como Deus Absoluto, e o consequente afastamento do Homem e do ideal do Cristo. É exemplo a proclamação de Maria, mãe de Jesus, como “Theotokos” – mãe de Deus – no Concílio de Éfeso realizado em 431 DC.


O Concílio – a seleção dos Evangelhos


Quanto à selecção dos Evangelhos, diz-nos HBP na sua obra “Ísis sem Véu”:

“Todo o atual dogmatismo religioso da Igreja se deve à Sortes Sanctorum, a prática de lançar à sorte alguma coisa com o fim da adivinhação, exercida pelo clero cristão primitivo e medieval. Não sendo capazes de concordar quais dos numerosos Evangelhos seriam os mais divinamente inspirados, foi resolvido no concílio de Nicea deixar a decisão nas mãos da intervenção milagrosa” 7. Como tal, os actuais Evangelhos Canónicos são estes e não outros devido à Sortes Sanctorum.

Curiosamente esta prática de adivinhação era considerada uma prática sagrada, se feita pelo clero cristão primitivo e medieval. Porém, se exercido por leigos, hereges ou pagãos o sortes sanctorum convertia-se, se acreditarmos nos piedosos padres, em sortes diabolurum ou sortilégio (feitiçaria) 8.

Ainda segundo Helena Blavatsky, “… Pappus diz-nos no seu Synodicon daquele Concilio: ‘Depois de terem promiscuamente colocado todos os livros que tinham sido referidos para determinação ao Concílio sob a mesa de comunhão de uma Igreja, eles (os Bispos) imploraram ao Senhor para que os livros inspirados fossem parar em cima da mesa, e assim sucedeu (…) Com base na autoridade das testemunhas eclesiásticas, portanto, tomamos a liberdade de dizer que o mundo cristão deve a sua ‘Palavra de Deus’ a um processo adivinhatório, pelo qual a Igreja, em seguida, condenou vítimas infelizes como conjuradores, encantadores, mágicos, feiticeiros e vaticinadores e os queimou aos milhares. Falando desse fenómeno verdadeiramente divino da escolha dos manuscritos, os padres da Igreja dizem que o próprio Deus preside ao Sortes”’ 9.

Refira-se que, nos primeiros séculos do Cristianismo. os Evangelhos teriam chegado a ser mais de 300. A sua redução para somente 4, decorrente do Concílio de Niceia, e o facto de se conhecerem hoje mais de 60 Evangelhos ditos “apócrifos” (como os de Tomé, de Pedro, de Filipe, de Tiago, dos Doze Apóstolos, dos Hebreus, etc.) vem demonstrar o papel preponderante da Igreja Católica na eliminação e adulteração dos primeiros escritos cristãos. Adicionalmente, sabe-se que os diversos grupos de Cristãos Gnósticos, de que são exemplo os Ebionitas e os Nazarenos, tinham os seus próprios Evangelhos, muito diferentes dos textos seleccionados sob os auspícios de Constantino.

Reforçando a incoerência de todo este processo, e de acordo com um dos compiladores da obra “Apócrifos, os Proscritos da Bíblia”, houve textos que, não obstante eliminados da Bíblia Romana, viriam mais tarde a ser nela reintegrados, como são exemplos o Livro da Sabedoria (atribuído a Salomão), o Eclesiástico ou Sirac, as Odes de Salomão, o Livro de Tobias, o Livro de Macabeus, e outros mais. Outra parte de escritos veterotestamentários ficou, no entanto, de fora, como o famoso Livro de Enoch, o Livro da Ascensão de Isaías, e os Livros III e IV dos Macabeus.


O Concílio – o Credo Niceno


Para prover a nova religião de origens divinas, os Bispos reconstruíram um credo existente, enfatizando a consubstanciação do Filho com o Pai, de Jesus com Deus:

“Creio em Deus Pai Todo Poderoso, Criador do Céu e da Terra, e de todas as coisas visíveis e invisíveis;

E em um Senhor Jesus Cristo, filho unigénito de Deus, gerado de Seu Pai antes de todos os tempos, Deus de Deus, Luz da Luz, Deus Verdadeiro de Deus Verdadeiro, gerado e não criado, consubstancial ao Pai (…)”

De facto, como já foi dito, um dos dois pontos na agenda do Concílio, foi a discussão sobre a natureza de Cristo e a natureza da sua relação com Deus: se o Pai tinha existido antes do Filho, e se Pai e Filho eram da mesma natureza ou “apenas” de natureza semelhante. A discussão centrou-se à volta de uma variação da palavra grega “homos”: em grego a palavra “homos” significa da mesma natureza ou substância, consubstancial. No entanto, adicionando um “i” à palavra – “homoios” – passa a significar de natureza semelhante. Decidiram os Bispos que o termo correcto para designar Jesus seria, na língua Grega, “homos”, ou seja, consubstancial.

A Trindade de Hipóstases divinas existente no Hinduísmo e no antigo Egito, assim como em todos os sistemas religiosos e filosóficos arcaicos 10, foi assim decalcada e antropomorfizada. Consequentemente o Concílio decidiu que a Trindade Cristã seria constituída por Três Pessoas: o Pai, o Filho (Jesus) e o Espírito Santo, e que Jesus, o Filho, era consubstancial a Deus.

Nos Mistérios e religiões arcaicas que antecederam a Cristandade, era bem conhecido que o termo “Filho de Deus” se usava para designar o grau de Iniciação nos mais altos Mistérios, a realização da sua natureza divina por parte do iniciado. Quando um aspirante alcançava, através da Iniciação, de grandes provas e sofrimentos, um elevado estado de perfeição, o seu nome era transformado em Christos, o “purificado” 11. Para a generalidade dos grupos Gnósticos, Jesus era a Sabedoria e a palavra de Deus em virtude da sua indissolúvel união com o Verbo. Cristo, filho de Deus, corresponde analogicamente ao segundo Aspecto do Logos e o princípio Cristico, ou Buddhi, no homem.

Como é óbvio, estas considerações metafísicas por muito enriquecedoras do ponto de vista do conhecimento religioso-filosófico que fossem, não beneficiavam em nada o poder e a autoridade da classe eclesiástica, que se começava a formar no Império através do domínio da facção ortodoxa nas paróquias.

Se os padres da Igreja Ortodoxa fizessem a distinção entre a preexistência da alma de Jesus (ou Jesus homem) e o Cristo ao qual ele ascendeu, isso implicava obviamente que qualquer alma podia, da mesma forma que Jesus, vir a identificar-se com o Filho e, portanto, a progredir na direcção de uma União com a Divindade. O poder e a autoridade do Clero, como únicos mediadores entre Deus e o Homem, seriam, desta forma, ameaçados.

Os padres tomaram portanto a direcção contrária – uma direcção que lhes permitisse o controlo absoluto dos seus crentes, um movimento na direcção da absoluta deificação de Jesus.

Em oposição, vários Bispos favoráveis às teses de Arius apresentaram um outro credo ao concilio, o qual foi rasgado, resultando na excomunhão de Arius. O livro de Arius foi igualmente queimado no próprio concílio. Uma confissão de fé (o Credo Niceno) foi então escrita no concílio e assinada por todos os presentes, de acordo com ordem dada por Constantino. Todos os que se recusaram a assinar o Credo, foram banidos.

O Credo subscrito em Niceia é muito mais do que a afirmação da Divindade de Jesus: é também a afirmação da nossa separação de Cristo e do Divino.

Entretanto, curiosamente, o Credo Niceno é também visto por alguns estudiosos como um simples (mas pouco lúcido) desenvolvimento da fórmula “O Buddha, A Lei, A Comunidade Monástica (Buddha, Dharma, Sangha), tendo sido o Concílio o momento em que o Cristianismo rompeu definitivamente com o Budismo eclesiástico, visto que os Essenos, os Terapeutas e os Gnósticos são identificados como o resultado da fusão entre o pensamento Indiano e Semítico, demonstrado por comparação entre a vida de Jesus e Buddha. Na parte lendária, ambas as histórias são idênticas. A parte lendária é contrastada com a característica correspondente noutras religiões, principalmente com a história Védica do Visvakarman” 12.

Aliás, são patentes as similaridades do Credo Niceno com a antiga doutrina Hindu. Krishna era considerado como a incarnação de Visnhu, cuja função era análoga à Segunda Pessoa da Trindade Cristã. No Bhagavad-Gita (datado aproximadamente de 250 AC), o mesmo Krishna é representado como a suprema personificação de Brahman – a divindade suprema que desce para iluminar o homem e contribuir para a sua salvação. Isto vem evidenciar, uma vez mais, que o Credo proposto pela facção ortodoxa e feito assinar pelos Bispos em Niceia resultou de uma amálgama fabricada com elementos de outras doutrinas mais antigas, adaptadas aos interesses e objectivos da nova religião imperial.

Posteriormente, ao longo da História da Igreja Católica, e no decorrer de vários concílios, foram também adicionadas ao Credo Niceno diversas outras referências reflectindo a constante adaptação da religião fabricada, nomeadamente a inclusão da passagem “… e encarnou pelo Espírito Santo na Virgem Maria…” e “… também por nós foi crucificado e sob Pôncio Pilatos”, numa clara tentativa de enfatizar um elemento Histórico na vida literal de Jesus, justamente por ser um elemento controvertido” 13.

 

Conclusão

 

Como vimos, a política do Império Romano foi lentamente assimilada na Igreja, sendo formulada uma religião totalitária com o nome de Catolicismo Romano. A ascensão de Constantino foi um período de grande crescimento da Igreja, com o criar da religião oficial do Império.

Vimos também que no concilio de Niceia se dão os primeiros passos no sentido de construir os alicerces da teologia desta igreja oficial: são “sorteados” os Evangelhos “Divinamente” inspirados, e Jesus Cristo é oficialmente declarado como Deus.
Após este acto, haverá sempre, para muitos, um abismo entre a humanidade e Cristo. De acordo com os padres pós-Niceia, Jesus é o próprio Deus Eterno Imanifestado e Absoluto. Também a noção de “Iniciação” é eliminada. As doutrinas gnósticas e esotéricas, cujos ensinamentos incidiam na evolução espiritual, tornaram-se supérfluas e indesejáveis. A teologia resultante do Credo Niceno promoveu uma passividade em que, de acordo com aquela fórmula, qualquer pessoa tem apenas que aceitar o credo, partilhar dos sacramentos, obedecer aos Bispos e à Igreja, bem como às decisões dos concílios, e será “salvo”.
Este concílio e as doutrinas daí advenientes prepararam também o terreno no qual floresceram as doutrinas do pecado original e do Inferno Eterno, contribuindo para a degradação e aviltamento da humanidade.

Vimos ainda que o triunfo do Cristianismo não pode ser separado da influência politica do Império Romano. Ao promover o casamento entre igreja e estado, os líderes da igreja tornaram-se monarcas e Constantino foi quase foi considerado um santo. Consequentemente, uma das grandes preocupações da Igreja foi (não a teologia) mas a eliminação de todos os elementos que se atravessaram na obtenção do poder absoluto. A partir daqui e até 1798 (quando os exércitos de Napoleão entraram em Roma), o Papa e as Monarquias governaram em uníssono.

Quando Constantino morreu, em 337, foi Baptizado (ironicamente só no seu leito de morte e por um seguidor de Arius) e enterrado na consideração que se tornara um décimo terceiro apóstolo. Na iconografia eclesiástica foi representado como recebendo uma coroa da mão de Deus…


O Concilio de Nicéia - outra visão


Por Paty Witch Maeve 09/04/2010 - 325 D.C ? É realizado o Concílio de Nicéia, atual cidade de Iznik, província de Anatólia (nome que se costuma dar à antiga Ásia Menor ), na Turquia asiática. A Turquia é um país euro-asiático, constituído por uma pequena parte européia, a Trácia, e uma grande parte asiática, a Anatólia. Este foi o primeiro Concílio Ecumênico da Igreja, convocado pelo Imperador Flavius Valerius Constantinus (285 - 337 d.C), filho de Constâncio I. Quando seu pai morreu em 306, Constantino passou a exercer autoridade suprema na Bretanha, Gália ( atual França ) e Espanha. Aos poucos, foi assumindo o controle de todo o Império Romano. Desde Lúcio Domício Aureliano (270 - 275 d.C.), os Imperadores tinham abandonado a unidade religiosa, com a renúncia de Aureliano a seus "direitos divinos", em 274. Porém, Constantino, estadista sagaz que era, inverteu a política vigente, passando, da perseguição aos cristãos, à promoção do Cristianismo, vislumbrando a oportunidade de relançar, através da Igreja, a unidade religiosa do seu Império. Contudo, durante todo o seu regime, não abriu mão de sua condição de sumo-sacerdote do culto pagão ao "Sol Invictus". Tinha um conhecimento rudimentar da doutrina cristã e suas intervenções em matéria religiosa visavam, a princípio, fortalecer a monarquia do seu governo.

Na verdade, Constantino observara a coragem e determinação dos mártires cristãos durante as perseguições promovidas por Diocleciano, em 303. Sabia que, embora ainda fossem minoritários ( 10% da população do império ), os cristãos se concentravam nos grandes centros urbanos, principalmente em território inimigo. Foi uma jogada de mestre, do ponto de vista estratégico, fazer do Cristianismo a Religião Oficial do Império : Tomando os cristãos sob sua proteção, estabelecia a divisão no campo adversário. Em 325, já como soberano único, convocou mais de 300 bispos ao Concílio de Nicéia. Constantino visava dotar a Igreja de uma doutrina padrão, pois as divisões, dentro da nova religião que nascia, ameaçavam sua autoridade e domínio. Era necessário, portanto, um Concílio para dar nova estrutura aos seus poderes.

E o momento decisivo sobre a doutrina da Trindade ocorreu nesse Concílio. Trezentos Bispos se reúnem para decidir se Cristo era um ser criado (doutrina de Arius) ou não criado, e sim igual e eterno como Deus Seu Pai (doutrina de Atanásio). A igreja acabou rejeitando a idéia ariana de que Jesus era a primeira e mais nobre criatura de Deus, e afirmou que Ele era da mesma "substância" ou "essência" (isto é, a mesma entidade existente) do Pai.

Assim, segundo a conclusão desse Concílio, há somente um Deus, não dois; a distância entre Pai e Filho está dentro da unidade divina, e o Filho é Deus no mesmo sentido em que o Pai o é. Dizendo que o Filho e o Pai são "de uma substância", e que o Filho é "gerado" ("único gerado, ou unigênito", João 1. 14,18; 3. 16,18, e notas ao texto da NVI), mas "não feito", o Credo Niceno, estabelece a Divindade do homem da Galiléia, embora essa conclusão não tenha sido unânime. Os Bispos que discordaram, foram simplesmente perseguidos e exilados. Com a subida da Igreja ao poder, discussões doutrinárias passaram a ser tratadas como questões de Estado. E na controvérsia ariana, colocava-se um obstáculo grande à realização da idéia de Constantino de um Império universal que deveria ser alcançado com a uniformidade da adoração divina.

O Concílio foi aberto formalmente a 20 de maio, na estrutura central do palácio imperial, ocupando-se com discussões preparatórias na questão ariana, em que Arius , com alguns seguidores, em especial Eusébio , de Nicomédia; Teógnis, de Nice, e Maris, de Chalcedon, parecem ter sido os principais líderes. Como era costume, os bispos orientais estavam em maioria. Na primeira linha de influência hierárquica estavam três arcebispos : Alexandre, de Alexandria; Eustáquio, de Antioquia e Macário, de Jerusalém, bem como Eusébio, de Nicomédia e Eusébio, de Cesaréia. Entre os bispos encontravam-se Stratofilus, bispo de Pitiunt (Bichvinta, reino de Egrisi). O ocidente enviou não mais de cinco representantes na proporção relativa das províncias : Marcus, da Calabria (Itália) ; Cecilian, de Cartago (África) ; Hosius, de Córdova (Espanha); Nicasius, de Dijon (França) e Domnus, de Stridon (Província do Danúbio). Apenas 318 bispos compareceram, o que equivalia a apenas uns 18% de todos os bispos do Império. Dos 318, poucos eram da parte ocidental do domínio de Constantino, tornando a votação, no mínimo, tendenciosa. Assim, tendo os bispos orientais como maioria e a seu favor, Constantino aprovaria com facilidade, tudo aquilo que fosse do seu interesse. As sessões regulares, no entanto, começaram somente com a chegada do Imperador. Após Constantino ter explicitamente ordenado o curso das negociações, ele confiou o controle dos procedimentos a uma comissão designada por ele mesmo, consistindo provavelmente nos participantes mais proeminentes desse corpo.

O Imperador manipulou, pressionou e ameaçou os partícipes do Concílio para garantir que votariam no que ele acreditava, e não em algum consenso a que os bispos chegassem. Dois dos bispos que votaram a favor de Arius foram exilados e os escritos de Arius foram destruídos. Constantino decretou que qualquer um que fosse apanhado com documentos arianistas estaria sujeito à pena de morte. Mas a decisão da Assembléia não foi unânime, e a influência do imperador era claramente evidente quando diversos bispos de Egito foram expulsos devido à sua oposição ao credo. Na realidade, as decisões de Nicéia foram fruto de uma minoria. Foram mal entendidas e até rejeitadas por muitos que não eram partidários de Ário.

Posteriormente, 90 bispos elaboraram outro credo (O "Credo da Dedicação") em, 341, para substituir o de Nicéia. (...) E em 357, um Concílio em Smirna adotou um credo autenticamente ariano. Portanto, as orientações de Constantino nessa etapa foram decisivas para que o Concílio promulgasse o credo de Nicéia, ou a Divindade de Cristo, em 19 de Junho de 325. E com isso, veio a conseqüente instituição a Santíssima Trindade e a mais discutida, ainda, a instituição do Espírito Santo, o que redundou em interpolações e cortes de textos sagrados, para se adaptar a Bíblia às decisões do conturbado Concílio e outros, como o de Constantinopla, em 38l, cujo objetivo foi confirmar as decisões daquele. A concepção da Trindade, tão obscura, tão incompreensível, oferecia grande vantagem às pretensões da Igreja. Permitia-lhe fazer de Jesus Cristo um Deus. Conferia a Jesus, que ela chama seu fundador, um prestígio, uma autoridade, cujo esplendor recaia sobre a própria Igreja católica e assegurava o seu poder, exatamente como foi planejado por Constantino. Essa estratégia revela o segredo da adoção trinitária pelo concílio de Nicéia. Os teólogos justificaram essa doutrina estranha da divinização de Jesus, colocando no Credo a seguinte expressão sobre Jesus Cristo : ?Gerado, não criado?. Mas, se foi gerado, Cristo não existia antes de ser gerado pelo Pai. Logo, Ele não é Deus, pois Deus é eterno!

Espelhando bem os novos tempos, o Credo de Nicéia não fez qualquer referência aos ensinamentos de Jesus. Faltou nele um "Creio em seus ensinamentos", talvez porque já não interessassem tanto a uma religião agora sócia do poder Imperial Romano. Mesmo com a adoção do Credo de Nicéia, os problemas continuaram e, em poucos anos, a facção arianista começou a recuperar o controle. Tornaram-se tão poderosos que Constantino os reabilitou e denunciou o grupo de Atanásio. Arius e os bispos que o apoiavam voltaram do exílio. Agora, Atanásio é que foi banido. Quando Constantino morreu ( depois de ser batizado por um bispo arianista), seu filho restaurou a filosofia arianista e seus bispos e condenou o grupo de Atanásio. Nos anos seguintes, a disputa política continuou, até que os arianistas abusaram de seu poder e foram derrubados. A controvérsia político/religiosa causou violência e morte generalizadas. Em 381 d.C, o imperador Teodósio (um trinitarista) convocou um concílio em Constantinopla. Apenas bispos trinitários foram convidados a participar. Cento e cinqüenta bispos compareceram e votaram uma alteração no Credo de Nicéia para incluir o Espírito Santo como parte da divindade. A doutrina da Trindade era agora oficial para a Igreja e também para o Estado. Com a exclusiva participação dos citados bispos, a Trindade foi imposta a todos como "mais uma verdade teológica da igreja". E os bispos, que não apoiaram essa tese, foram expulsos da Igreja e excomungados.

Tudo isso nos leva a crer que o homem chamado "Jesus Cristo" na maneira descrita nos Evangelhos nunca existiu. Suas peripécias são fictícias; não padeceu sob nenhum Pôncio Pilatos; não foi nem poderia jamais ser a única Encarnação do Verbo; e qualquer Igreja, seita ou pessoa que diga o contrário ou está enganada ou enganando. Não quero dizer com isto que um homem assim não pudesse ter nascido, pregado e padecido. Segundo a Doutrina Teosófica, teria existido um homem chamado Joshua Ben Pandira. Tais homens nascem continuamente, e continuarão a nascer por todos os tempos: Encarnações do Logos, Templos do Espírito Santo, Cruzes de Matéria coroadas pela Chama do Espírito.

Direi mais: Houve, em certa ocasião, um homem que alcançou no mais alto grau a consciência de sua própria Divindade; e este homem morreu em circunstâncias análogas (porém não idênticas!) àquelas narradas nos Evangelhos. Seu nascimento perdeu-se na noite dos tempos: ele foi o original do "Enforcado" ou "Sacrifício" no Tarô, e os egípcios o conheciam pelo nome de Osíris. Foi esse Iniciado quem formulou na carne a fórmula do Deus Sacrificado. Esta é a fórmula da Cerimônia da Morte de Asar na Pirâmide, que foi reproduzida nos mistérios de fraternidades maçônicas da tradição de Hiram, das quais o exemplo mais perfeito foi o Antigo e Aceito Rito Escocês. O Grau 33° desse rito indicava uma Encarnação do Logos, a descida do Espírito Santo; a manifestação, na carne, de um Cristo; a presença do Deus Vivo. Por volta do século IX, o credo já estava estabelecido na Espanha, França e Alemanha. Tinha levado séculos desde o tempo de Cristo para que a doutrina da Trindade "pegasse". As políticas do governo e da Igreja foram as razões que levaram a Trindade a existir e se tornar a doutrina oficial da Igreja. Como se pode observar, a doutrina trinitária resultou da mistura de fraude, política, um imperador pagão e facções em guerra que causaram mortes e derramamento de sangue. As Igrejas Cristãs hoje em dia dizem que Constantino foi o primeiro Imperador Cristão, mas seu "cristianismo" tinha motivação apenas política. É altamente duvidoso que ele realmente aceitasse a Doutrina Cristã. Ele mandou matar um de seus filhos, além de um sobrinho, seu cunhado e possivelmente uma de suas esposas. Ele manteve seu título de alto sacerdote de uma religião pagã até o fim da vida e só foi batizado em seu leito de morte. ************ OBS.: Em 313 d.C., com o grande avanço da "Religião do Carpinteiro", o Imperador Constantino Magno enfrentava problemas com o povo romano e necessitava de uma nova Religião para controlar as massas. Aproveitando-se da grande difusão do Cristianismo, apoderou-se dessa Religião e modificou-a, conforme seus interesses. Alguns anos depois, em 325 D.C, no Concílio de Nicéia, é fundada, oficialmente, a Igreja Católica...

PARTE 3